segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Análise da área central de CURITIBA

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ - OS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURÍSTICO URBANO NO PROCESSO DE PLANEJAMENTO, Dissertação de Mestrado: ANA PAULA SIVIERO, CURITIBA / 2005.

Dissertação apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Mestre em Geografia, Departamento de Mestrado em Geografia, Setor de Ciências da Terra, Universidade Federal do Paraná.

Orientador: Prof. Dra. Cicilian Luiza Löwen Sahr

Dedico este trabalho aos meus pais, Tadeu Antônio Siviero e Ivete Fumagalli, e ao meu padrasto Laércio Bonifácio Pereira, pelo apoio desmedido nas horas difíceis e pela carinhosa presença nos momentos de alegria.

AGRADECIMENTOS
“Agradecer é uma das coisas mais belas que o ser humano pode fazer, admitir que houve um momento em que se precisou de alguém. Agradecer é reconhecer que o homem jamais poderá lograr êxito sozinho, ou ser auto-suficiente”.
Agradeço a compreensão e paciência dos meus filhos, João Vitor e Pedro, nos muitos momentos em que precisei estar ausente, e aos meus familiares pelo desmesurado carinho para que não se sentissem sozinhos.

Aos amigos que me deram força para não desistir. Aos colegas de profissão, e grandes amigos, de Curitiba, Guarapuava e Dourados, que me ajudaram na coleta de dados, quando eu estava distante do meu objeto de estudo.

Aos professores que acompanham de forma direta ou indireta minha trajetória acadêmica e profissional, e sei, acreditam na minha capacidade. Em especial a Professora Eliane Regina Ferretti, que me incentivou a tentar sem medo de fracassar.
Aos professores e coordenadores do Departamento de Mestrado em Geografia, pelos valiosos ensinamentos. Ao secretário do curso, Zem, pelo suporte nas questões administrativas do programa. E de forma muito especial, à Professora Cicilian Luiza Löwen Sahr, pela brilhante orientação e pela compreensão nos momentos difíceis pelos quais passei no decorrer do mestrado.

Ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – 10ª Superintendência Regional de Curitiba – pela atualização de dados que subsidiaram a pesquisa.
Ao Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba que através da compilação detalhada de dados, enriqueceram a pesquisa.

Ao Centro Universitário da Grande Dourados – UNIGRAN, pelo incentivo à obtenção do título de mestre.

Ao meu amigo, coordenador e sócio, Djanires Lageano Neto, pela acolhida em Dourados, por toda confiança e oportunidade.

A todos aqueles que, de uma forma ou de outra, contribuíram para realização deste trabalho.

É necessário destacar a necessidade de incorporar dimensões éticas e morais socialmente reconhecidas para orientar a política (urbana) e as atividades, de forma que fiquem impregnadas de conteúdos de historicidade, beleza e identidade.
Diego Carrión

SUMÁRIO
LISTA DE ILUSTRAÇÕES.................................
RESUMO...............................................
ABSTRACT.............................................
INTRODUÇÃO...........................................
1 PLANEJAMENTO, TURISMO E ESPAÇO URBANO: REFLEXÕES TEÓRICAS E ARTICULAÇÕES.......3
1.1 TURISMO E TURISMO URBANO: O QUE É ISTO AFINAL?...............................3
1.2 O ESPAÇO URBANO E O ESPAÇO TURÍSTICO URBANO: ESTAMOS FALANDO DA MESMA COISA?.7
1.3 OS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURÍSTICO URBANO.....................................10
1.4 PLANEJAMENTO URBANO E PLANEJAMENTO TURÍSTICO: É POSSÍVEL INTEGRÁ-LOS?............................................................................14
1.5 EM BUSCA DE UMA METODOLOGIA DE APREENSÃO DA REALIDADE.......................17
2 O ESPAÇO TURÍSTICO URBANO E SEUS ELEMENTOS: UMA ANÁLISE DO CENTRO DE CURITIBA.19
2.1 O CENTRO COMO “BAIRRO” E “BORDAS/LIMITES”...................................19
2.2 OS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURISTICO DO CENTRO..................................30
3 O PLANEJAMENTO TURÍSTICO COMO INTEGRANTE DO PLANEJAMENTO URBANO: UMA ANÁLISE DO CENTRO DE CURITIBA..............................................................45
3.1 A ESTRUTURA DE PLANEJAMENTO NO BRASIL HOJE: BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO..........45
3.1.1 O Planejamento do Desenvolvimento Urbano..................................46
3.1.2 O Planejamento Setorial do Turismo........................................48
3.2 O PLANEJAMENTO URBANO E TURISTICO: UMA ANÁLISE DE PLANOS E PROJETOS.........54
3.2.1 O Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo....................................54
3.2.2 A “Linha Pinhão – Pegadas da Memória”.....................................59
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................75
REFERÊNCIAS.....................................................................79
ANEXOS..........................................................................86
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
MAPA 1 - CENTRO DE CURITIBA.....................................................21
QUADRO 1 - OS ELEMENTOS DO ESPAÇO URBANO NUM COMPARATIVO ENTRE AUTORES..........15
QUADRO 2 - POPULAÇÃO ABSOLUTA, DENSIDADE DEMOGRÁFICA E TAXA DE CRESCIMENTO DO CENTRO DE CURITIBA - 1970, 1980, 1991 E 2000...........................................28
QUADRO 3 - CLASSIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURÍSTICO URBANO: BENS TOMBADOS DA ÁREA CENTRAL DE CURITIBA........................................................32
QUADRO 4 - FOTOS DOS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURISTICO URBANO DA ÁREA CENTRAL DE ACORDO COM A CLASSIFICAÇÃO DE LYNCH (1997) E BOULLÓN (2002)............................41
QUADRO 5 - CLASSIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS TURÍSTICO DO CENTRO DE CURITIBA APRESENTADOS NA “LINHA PINHÃO”...............................................................62
QUADRO 6 - EXEMPLOS DE ELEMENTOS TURÍSTICOS DO CENTRO DE CURITIBA APRESENTADOS NA “LINHA PINHÃO”...............................................................63
FIGURA 1 - BAIRROS SEGUNDO AS ADMINISTRAÇÕES REGIONAIS DE CURITIBA..............20
FIGURA 2 - LINHA PINHÃO: PEGADAS DA MEMÓRIA.....................................61
FOTO 1 - IGREJA MATRIZ NA PRAÇA TIRADENTES......................................22
FOTO 2 - ANTIGO BONDE EXPOSTO NA RUA XV.........................................26
FOTO 3 - UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ.........................................26
FOTO 4 - PALÁCIO AVENIDA DECORADO PARA O NATAL..................................39
FOTO 5 - CHAFARIZ DA PRAÇA OSÓRIO...............................................40
FOTO 13 - PLACA: CONFEITARIA DAS FAMÍLIAS EM COMEMORAÇÃO AOS 300 ANOS DE CURITIBA.60

RESUMO
Este estudo tem como questão central a análise dos elementos do espaço turístico urbano e suas relações com o processo de planejamento. Seu objeto de investigação concentra-se na área central de Curitiba-Pr. As reflexões teóricas baseiam-se, sobretudo, em Kevin Lynch, José Lamas e Roberto Boullón. Busca-se, primeiramente, diferenciar e articular planejamento, turismo e espaço urbano, além de apontar os elementos constituintes do espaço turístico urbano.

Para tanto, contrapõem-se diferentes autores. Num segundo momento, a área central de Curitiba é apresentada como “escala bairro”, com “bordas/limites”, e também descrita através de seus elementos: “setores”, “vias”, “pontos nodais” e “marcos”. Como uma análise do universo dos “logradouros”, “marcos”, “setores” e “roteiros” da área central tornar-se-ia por demasiadamente exaustiva, optou-se por limitar-se apenas a bens tombados, ou seja, aqueles que estão sob proteção, classificando-os de acordo com os elementos do espaço urbano mencionados anteriormente e com base nos estudos de LYNCH (1997) e BOULLÓN (2002).

Material estatístico e fotográfico enriquecem a análise. Num terceiro momento, confrontam-se as concepções do planejamento urbano e do planejamento turístico para esta área, analisando-se de que forma os elementos identificados são trabalhados pelo planejamento. Entre os planos e projetos levantados está o da “Linha Pinhão”, e o “Plano de Uso e Ocupação do Solo”.

A metodologia de investigação baseia-se, portanto, em levantamentos bibliográfico e documental. Entre o material bibliográfico estão livros e artigos de cunho teórico e também local, ou seja, sobre a cidade de Curitiba. Quanto ao material documental, destaque são planos e projetos turísticos e/ou urbanísticos que afetam, direta ou indiretamente, a área central da cidade. Observações de campo e documentação fotográfica complementam as informações necessárias para esta proposta.

Com relação aos elementos do espaço turístico urbano na área central, o planejamento setorial do turismo deixa mais evidente o emprego destes elementos (ex. “Linha Pinhão”), já o planejamento urbano, propriamente dito, trabalha numa concepção mais complexa (ex. Plano de Uso e Ocupação do Solo).

Palavras-chave: Turismo, Planejamento e Espaço Urbano.

ABSTRACT
This study has as central question the analysis of the elements from the urban touring space and its relations with the planning process. Its subject of investigation concentrates on the central area of Curitiba, Pr. The theoretical thoughts base especially on Kevin Lynch, José Lamas and Roberto Boullón. First, it is sought to distinguish and organize planning, tourism and urban space and also point out the elements which establish the urban touring space. For this, it is confronted different authors. At a second moment, the central area of Curitiba is presented as “neighborhood scale”, with “borders / limits” and it is also described through its elements: ‘sections’, ‘roads’, ‘nodal points’ and ‘landmarks’. As an analysis of the universe from “public areas”, “landmarks”, “sections” and “routes” of the central area could become excessively exhausting, it was chosen to limit only to listed buildings, that is, those which are protected, classifying them according to the elements from the urban space mentioned before and based on the studies from LYNCH (1997) and BOULLÓN (2002).

Statistical and photographic materials enrich the analysis. At the third moment, it is compared the conceptions of urban planning and touring planning of this area, analyzing in which manner these identified elements are worked on this planning. Between the collected plans and projects are “Linha Pinhão” (Pine nut Line), and “Plano de Uso e Ocupação do Solo” (Use Plan and Soil Occupation).

So, the methodology of the investigation is based on bibliographic and documentary surveys. As bibliographic material, there are books and articles with theoretical character and also local one about Curitiba. As for documentary material, the highlights are plans and touring and / or town planning projects which affects, direct or indirectly, the central area of the city.

Field observations and photographic documentary complement the information necessary to this proposition. In relation to the elements from the urban touring space in the central area, the section planning of tourism shows clearly the use of these elements (e.g. “Pine nut Line”) and the urban planning works in a more complex conception (e.g. “Use Plan and Soil Conservation”).

Keywords: Tourism, Planning and Urban Area.

INTRODUÇÃO
Este estudo aborda os elementos do espaço turístico urbano no processo de planejamento. Entende-se que existe uma diferenciação entre o espaço urbano produzido pelo turismo e o espaço urbano propriamente dito. O espaço turístico envolve a criação de um espaço produtivo, enquanto o espaço urbano constitui-se em suporte e também atrativo para o turismo. Desta forma, os planejamentos turístico e urbano são indissociáveis.

Na delimitação da área de estudo procurou-se enfatizar a área central da cidade de Curitiba. Isso porque as extensões territoriais e seus conteúdos sociológicos são tão grandes e diversificados, que, segundo Yázigi (2003, p. 15) “[...] é humanamente impossível para um pesquisador dominar tudo”. Daí a delimitação em se estudar apenas os elementos do espaço urbano e as análises qualitativas como saída metodológica.
A análise dos elementos do espaço turístico do Centro de Curitiba é realizada, principalmente, com base em Lynch (1997) e Boullón (2002).

A escolha do Centro de Curitiba, enquanto objeto de estudo, não é aleatória. Acredita-se que este “bairro”, por ter vivenciado todas as fases históricas da cidade e do planejamento, e ainda, por seu valor histórico e simbólico, possa melhor contribuir para a análise proposta.

Assim, a presente investigação tem como objetivo geral analisar os elementos do espaço turístico urbano da área central de Curitiba, enfocando os aspectos históricos, políticos e culturais que subsidiam uma discussão sobre a inter-relação entre os planejamentos urbano e turístico.

Para fundamentação da pesquisa foram considerados quatro princípios norteadores.

Primeiramente a pesquisa passou por um processo de análise e reflexão histórica, permeando-se a teoria com estudos bibliográficos de documentos, livros, artigos, dissertações e teses existentes.

Num segundo momento buscou-se informações, de caráter mais geral, em níveis federal, estadual e municipal sobre as políticas públicas de desenvolvimento urbano e as políticas setoriais de turismo.

Num terceiro momento, a pesquisa se caracterizou em trabalho de campo, que consistiu em observações in loco sobre as transformações do espaço urbano da área central da cidade, referentes, principalmente, as mudanças de uso e transformações na área central, além da interpretação dos elementos com destacado potencial turístico nesta área.

No quarto momento, passou-se a analisar as inter-relações entre os planejamentos urbano e turístico. Foi necessário sistematizar as informações coletadas por meio de análises comparativas dos instrumentos que norteiam o desenvolvimento urbano da cidade de Curitiba e daqueles que traçam as diretrizes para o turismo.

O primeiro capítulo apresenta o referencial teórico. Nele busca-se tentar articular conceitos como turismo, espaço urbano, espaço turístico, planejamento urbano e planejamento turístico. Para fundamentar esse capítulo foram pesquisados diversos autores que possibilitaram reflexões sobre o tema proposto.

O capítulo 2 aborda os elementos do espaço turístico urbano a partir da análise do centro enquanto “bairro”. A estruturação do capítulo fundamentou-se na análise dos bens tombados na área central, de acordo com os elementos urbanos e turísticos apontados por Lynch (1997) e Boullón (2002).

O capítulo 3 faz uma análise dos elementos turísticos do espaço turístico urbano no processo de planejamento através da evolução das políticas de desenvolvimento urbano e de turismo. Para contextualizar, analisa-se o planejamento urbano do Centro de Curitiba a partir de seu Plano de Uso e Ocupação do Solo, e o planejamento setorial do turismo através do projeto da “Linha Pinhão”. Busca-se demonstrar a inseparabilidade do desenvolvimento turístico local pautado no planejamento e na ordenação urbana das cidades.

1 PLANEJAMENTO, TURISMO E ESPAÇO URBANO: REFLEXÕES TEÓRICAS E ARTICULAÇÕES
O turismo ultrapassa os setores convencionais da economia, envolvendo aspectos de natureza social, cultural, espacial e ambiental. Nesse sentido é que se atribui à dificuldade de definições específicas e restritas a atividade turística, considerando a heterogeneidade do setor, freqüentemente descrito como uma atividade multifacetada.

Neste capítulo procura-se analisar a discussão conceitual até agora registrada na produção científica relacionada ao turismo entendido como prática social. Não se trata de uma discussão epistemológica para a construção de uma teoria do turismo, nem mesmo de uma revisão exaustiva da literatura. As reflexões se centram, sobretudo, na articulação entre planejamento, turismo e espaço urbano.

Para iniciar tais reflexões é necessário considerar toda a complexidade do fenômeno turístico, suas relações sociais e espaciais, capazes de fomentar o processo de (re)produção do espaço. Desta forma, primeiramente busca-se um conceito para turismo e turismo urbano. Num segundo momento delineiam-se diferenciações entre espaço urbano e espaço turístico urbano. Num terceiro momento apresentam-se os elementos do espaço turístico urbano. E, por fim, se analisam as possibilidades de integração entre planejamento urbano e planejamento turístico.

1.1 TURISMO E TURISMO URBANO: O QUE É ISTO AFINAL?
McIntosh (1977 apud BENI 2002) define o turismo como ciência e atribui à atividade uma conotação qualitativa quanto à satisfação das necessidades e desejos dos turistas. Já Boullón (2002) salienta que não se pode atribuir ao turismo o conceito de ciência, uma vez que as idéias que fundamentam a atividade turística, embora não sejam superficiais, são ainda desconectas. Ou seja, o turismo não se originou de uma teoria, mas de uma realidade espontânea observada por diferentes áreas do conhecimento.

Consideramos, de fato, que o turismo não pode ser considerado uma ciência, pois sua fundamentação permite considerá-lo um fenômeno social cujo ponto de partida é a existência de tempo livre, e tem na base da construção dos estudos relacionados à área, a contribuição de diferentes e diversas áreas do conhecimento.

Existem diversos aspectos explícitos associados ao turismo. É nesse sentido, que se identificam três tendências para a definição de turismo: a econômica, a técnica e a holística. Esta é uma tentativa de adaptar definições para atender objetivos diversos de diferentes óticas.

As definições econômicas só reconhecem no turismo implicações econômicas ou empresariais. A primeira definição sob essa ótica foi apresentada pelo economista austríaco Schullern em 1910, que atribuía ao turismo “a soma das operações, principalmente de natureza econômica, que estão diretamente relacionadas com a entrada, permanência e deslocamento de estrangeiros para dentro e para fora de um país, cidade ou região” (apud BENI, 2002, p. 34).

Se comparada esta primeira definição a outras posteriormente apresentadas, podem ser observadas controvérsias entre estas, mesmo que o enfoque econômico prevaleça. Para Sessa (1993), o turismo aparece não como uma atividade terciária, mas como uma atividade industrial real, pois se transforma matéria-prima em produtos de comércio e consumo (apud BENI, 2002).

O turismo envolve, entretanto, a prestação de serviços, que o caracteriza como uma atividade terciária, não permitindo conceituá-lo como indústria, uma vez que no turismo, a matéria-prima – no caso os atrativos turísticos – não são processados, ou seja, na indústria a matéria-prima obtém-se de recursos naturais e no turismo é fornecida pelos atrativos.

Para Boullón (2002, p. 55), O termo matéria-prima não tem o mesmo significado no turismo e na indústria. Lembremos que, em primeiro lugar, é preciso distinguir que, na indústria, a matéria-prima deve ser extraída e transformada em outra coisa.

No turismo, ao contrário, os atrativos devem permanecer intactos ou, caso sofram intervenções, essas ações ficam limitadas à restituição de alguma qualidade que possam ter perdido, seja pela ação destrutiva de outros setores, dos próprios turistas, ou pelo passar do tempo.

Isto não significa, todavia, que os atrativos não agreguem valores ao se transformarem em produtos competitivos e fomentarem fluxos de pessoas, porém não são ‘processados’ industrialmente de forma tangível e concreta. O caráter fixo no espaço dos atrativos turísticos é uma característica específica da atividade turística.

O turismo passa a ser considerado, assim, como uma atividade sócio-econômica, pois gera a produção de bens e serviços para o homem, visando à satisfação de diversas necessidades básicas e secundárias.

Uma definição técnica de turismo é estabelecida pela Organização Mundial do Turismo (OMT), que considera o turismo como “[...] as atividades de pessoas que viajam para lugares afastados de seu ambiente usual, ou que neles permaneçam por menos de um ano consecutivo, a lazer, a negócios ou por outros motivos” (OMT, 2003, p. 20).

Há ainda as definições holísticas, que procuram abranger a totalidade do assunto.

Dentre elas, destacam-se a definição dos professores suíços Hunziker e Kraft de 1942, que colocam o turismo como “a soma dos fenômenos e das relações resultantes da viagem e da permanência de não-residentes, na medida em que não leva à residência permanente e não está relacionada a nenhuma atividade remuneratória” (apud BENI, 2002, p. 36). Tal definição remete-se aos turistas como foco central do turismo, e permite interpretações multidisciplinares.

Sentindo a necessidade de incorporar ao estudo do turismo, teorias e conceitos de campos afins, como a antropologia, a sociologia, a economia, a geografia, a ciência política, a ecologia e os estudos urbanísticos, Jafar Jafari apresenta outra definição holística de turismo. Para ele o turismo “é o estudo do homem longe de seu local de residência, da indústria que satisfaz suas necessidades, e dos impactos que ambos, ele e a indústria, geram sobre os ambientes físico, econômico e sociocultural da área receptora” (JAFARI apud BENI, 2002, p. 36).

Todas essas definições abordam elementos comuns, como: o deslocamento, a permanência fora do domicílio, a temporalidade, o objeto do turismo e o próprio turista. E trazem ainda abordagens diferentes de acordo com a ótica apresentada, o que caracteriza o turismo, ainda, como uma atividade multidisciplinar envolvendo várias áreas do conhecimento, além das citadas por Jafari, outras também reconhecidas, como o direito, o marketing, a administração e a psicologia.

Todas essas considerações em torno do desenvolvimento da atividade turística, não ocorrem desvinculadas do contexto de espaço, uma vez que, tanto os atrativos quanto os equipamentos e a infra-estrutura se manifestam de forma física e visível neste espaço, sobretudo quando se trata do espaço urbano.

Segundo Cruz (2001), o turismo urbano é de grande relevância na mobilidade mundial, afinal, desconsiderando as modalidades de turismo de aventura, ecológico, rural, entre outros, cujo suporte material constitui-se de locais pouco ou nada urbanizados, o turismo em ambientes urbanos representa a quase totalidade do fluxo turístico mundial. Há nas cidades atratividade turística, por tudo o que elas representam “como obras de arte das sociedades humanas, como lugares de encontro, do ir e vir, do acontecer de modo geral” (p. 16).

Algumas das transformações que o turismo produz podem ser previstas, outras talvez sejam inesperadas, a problemática consiste em gerenciar essas mudanças assegurando seus benefícios e identificando os impactos negativos para que sejam minimizados, ou para que os núcleos receptores não sofram com o declínio de suas funções urbanas tradicionais. Quando as mudanças são desejadas por algumas das partes no processo de desenvolvimento turístico e indesejadas por outros, o processo de mudança ganha um caráter político.

Segundo Tyler e Guerrier (2001), o turismo urbano trata dos processos sociais de mudança e dos processos de decisão de políticas que ditam a natureza dessa mudança e que identificam ganhadores e perdedores. Trata-se da busca dos meios pelos quais a mudança afeta os processos sociais da cidade e da necessidade de gerenciar a inevitabilidade do turismo urbano.

Gerir o turismo urbano remete inevitavelmente, a busca pela compreensão dos processos de reestruturação e valorização do espaço urbano, com os desafios de uma economia globalizada e competitiva, verificados em um espaço dinâmico, como o espaço urbano em questão.


1.2 O ESPAÇO URBANO E O ESPAÇO TURÍSTICO URBANO: ESTAMOS FALANDO DA MESMA COISA?
Antes de procurar diferenciar espaço urbano e espaço turístico, é preciso primeiramente distinguir os conceitos de espaço urbano e cidade. Segundo Santos (1988) e Levebvre (1999), a cidade é a forma, é a materialização de determinadas relações sociais, enquanto que o espaço urbano é o conteúdo, é a materialização no espaço das próprias relações sociais. Entretanto, não se pode fazer uma separação absoluta entre espaço urbano e cidade. Souza (2003) faz referência a esta interdependência, para ele a cidade é o concreto, o conjunto de redes, enfim a materialidade visível do urbano, enquanto que este é o abstrato, porém o que dá sentido e natureza a cidade.

A cidade concentra pessoas e os meios de produção, e ainda, segundo Carlos (1994, p. 83), é o lugar da divisão econômica do trabalho, da divisão social do trabalho dentro de um processo produtivo e na sociedade e é também um elo na divisão espacial do trabalho na totalidade do espaço. E acrescenta que “[...] o espaço urbano aparece como concentração através da cidade [...]”, sendo esta, uma das condições históricas necessárias ao seu aparecimento e que transcende uma concepção meramente econômica. O processo de produção do espaço urbano não refere-se apenas a questão econômica, mas também as questões sociais, políticas, ideológicas e jurídicas, articuladas em sua totalidade na formação econômica e social.

Nesse sentido, “o urbano é mais que um modo de produzir é também um modo de consumir, pensar, sentir; enfim, é um modo de vida” (CARLOS, 1994, p. 84). A cidade aparece como forma de apropriação deste espaço produzido.

Já Lamas (2000) identifica a forma da cidade enquanto a maneira como a mesma se organiza e se articula à sua arquitetura, e neste contexto, “[...] a arquitetura não pode ser compreendida senão como parte da cidade, como um acontecimento submerso num sistema complexo de relações (espaciais e outras) com o resto do espaço urbanizado” (p. 41).

Para Cavalcanti (2001, p. 15), “a cidade é um espaço geográfico, é um conjunto de objetos e de ações, mas entendendo que ela expressa esse espaço, 7
como lugar de existência das pessoas, não apenas como um arranjo de objetos, tecnicamente orientado”.

Pensar o espaço como um conjunto de objetos e de ações, implica ressaltar os estudos de Milton Santos referentes à temática em questão, onde o autor oportunamente coloca que:

O espaço é formado por um conjunto indissociável, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e sistemas de ações, não considerados isoladamente, mas como um quadro único no qual a história se dá. [...] Sistemas de objetos e sistemas de ações interagem. De um lado, os sistemas de objetos condicionam a forma como se dão as ações e, de outro lado, o sistemas de ações leva à criação de objetos novos ou se realiza sobre objetos preexistentes. É assim que o espaço encontra sua dinâmica e se transforma (SANTOS, 2002, p. 63).

Espaço urbano é definido por Corrêa (2002, p. 9) como um espaço “[...] fragmentado e articulado, reflexo e condicionante social, um conjunto de símbolos e campos de lutas”. É assim, a própria sociedade em uma de suas dimensões, aquela mais aparente, materializada nas formas espaciais.

O espaço urbano constitui-se, portanto, no conjunto de diferentes usos da terra (comerciais, de serviços, industriais, residenciais, de lazer etc) justapostos entre si, o que retrata um espaço fragmentado. Este, todavia, é articulado, uma vez que cada uma de suas partes mantém relações espaciais com as demais. É ainda, um reflexo da sociedade do presente e do passado, que deixa suas marcas na organização espacial, sendo assim, desigual e mutável. É condicionante social, ou seja, o lugar onde as diversas classes sociais vivem e se reproduzem. Envolve também as crenças, valores e mitos criados na sociedade e projetados nas formas espaciais: monumentos, lugares sagrados, dentre outros.

Além de ser cenário e objeto das lutas sociais, que buscam, entre outros, o direito à cidade e à cidadania plena e igual para todos.

Do ponto de vista espacial, o turismo é um grande consumidor do espaço, responsável também pela produção e transformação do mesmo, e toda sua complexidade é expressa pelas relações sociais e pela sua materialização, que compõe o processo de produção desse espaço.

É pelo processo de consumo do espaço pelo turismo que se gesta os espaços turísticos. Porém, a organização do espaço turístico requer uma crescente racionalidade, que deve estar apoiada em um processo de planejamento dotado de ações responsáveis e de objetivos previamente estabelecidos.

A abordagem espacial do turismo precisa de uma referência a relação entre turismo e o meio urbano. Para Castrogiovanni (2000), a ordenação urbana compreende o processo de organização dos elementos que compõem o espaço urbano de acordo com o estabelecimento de relações de ordem, com base na construção de uma hierarquia de valores, no caso, com o objetivo de facilitar o desenvolvimento das atividades turísticas. A ordenação turística é a busca conveniente dos meios existentes no espaço para o sucesso das propostas relativas às atividades turísticas.

A cidade é, portanto, o espaço apropriado pelas sociedades, e este espaço deve ser visto como um fator de evolução social, produzido e reproduzido constantemente.

As cidades são ainda, partes representativas da complexidade do espaço geográfico.

Embora turismo e espaço não apresentem o mesmo significado, ambos se complementam, e a reflexão sobre suas características particulares permite uma futura e melhor compreensão do chamado espaço turístico.

Segundo Boullón (2002, p. 79), “o espaço turístico é conseqüência da presença e distribuição territorial dos atrativos turísticos que, não devemos esquecer, são a matéria-prima do turismo. Este elemento do patrimônio turístico, mais o empreendimento e a infra-estrutura turística, são suficientes para definir o espaço turístico de qualquer país”.

Segundo Cruz (2001, p. 24) existe uma diferença fundamental entre o espaço urbano produzido pelo turismo e o espaço urbano. É que, “[...] no primeiro caso, trata-se da criação de um espaço produtivo”. O espaço urbano em si constitui-se suporte e, ao mesmo tempo, atrativo para o turismo.

Tais reflexões permitem considerar a diferença entre o espaço urbano propriamente dito, e o espaço turístico urbano. O primeiro é a base de estruturação das cidades e de todas as relações estabelecidas neste espaço, o espaço turístico urbano é mais uma forma de apropriação deste espaço para o desenvolvimento de atividades turísticas.

O turismo utiliza-se de toda infra-estrutura e facilidades do espaço urbano para seu pleno desenvolvimento, podendo ainda, ser responsável pela (re)produção deste espaço, de acordo com as necessidades que impulsionam a concretização da atividade turística nas destinações.

1.3 OS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURÍSTICO URBANO
Lynch (1997) em seus estudos sobre A Imagem da Cidade, trabalha com o conceito de “legibilidade” do ambiente urbano. Para o autor uma cidade só é “legível” se puder ser “imaginável”, ou seja, é necessário que haja clareza física na imagem.

Para ele, existem cinco elementos da cidade que podem ser percebidos pelos seus usuários: os caminhos, os pontos nodais, os bairros, os limites e os marcos.

Adaptando estes elementos ao turismo, Boullón (2002) aponta-os como: logradouros, marcos, bairros, setores, bordas e roteiros.

Lamas (2000) trabalha ainda com os elementos morfológicos do espaço urbano, pormenorizando alguns dos elementos identificados nos estudos de Lynch (1997) e Boullón (2002).

Para ele, entre os elementos morfológicos do espaço urbano estão: o solo, os edifícios, o lote, o quarteirão, a fachada, o logradouro, o traçado e a rua, a praça, o monumento, a árvore e a vegetação, e também, o mobiliário urbano.

Segundo Lamas (2000, p. 38), o estudo da morfologia urbana “[...] ocupa-se da divisão do meio urbano em partes (elementos morfológicos) e da articulação destes entre si e com o conjunto que definem os lugares que constituem o espaço urbano”.

Os logradouros de Boullón (2002) correspondem aos caminhos e pontos nodais de Lynch (1997). Tratam-se de espaços abertos ou cobertos de uso público, em que o morador da cidade e o turista podem entrar e percorrer livremente.

Como exemplos podem ser citados: um parque, um zoológico, uma praça, uma galeria, um centro comercial, uma feira, um mercado, o átrio de uma igreja ou uma estação de ônibus. O que diferencia os caminhos dos pontos nodais é que estes últimos têm natureza de conexão, como, por exemplo, um cruzamento de ruas ou uma esquina.

O logradouro de Lamas (2000), não constitui, em sua acepção, um elemento morfológico autônomo, ele tem outro significado, sendo o espaço privado do lote1 não ocupado por construção. Trata-se de “[...] um complemento residual, um espaço

Para LAMAS (2000), o lote (parcela fundiária) é um princípio essencial da relação dos edifícios com o terreno. Não é apenas uma porção cadastral, mas também a gênese e a base da edificação, que fica escondido: não é utilizado pela habitação nem contribui para a forma dos espaços públicos” (p. 102). O que se aproxima dos caminhos e dos pontos nodais de Lynch (1997) e dos logradouros de Boullón (2002) são os elementos morfológicos rua e praça.

Para Lamas (2000), o elemento rua destaca-se pela sua função de deslocamento, percurso e mobilidade de bens, pessoas e idéias. A rua existe nos vários níveis ou escalas da forma urbana, desde a rua pedonal até a travessa, avenida ou via rápida.

Ele aponta a praça como o “lugar intencional do encontro, da permanência, dos acontecimentos, de práticas sociais, de manifestações de vida urbana e comunitária e de prestígio, e, consequentemente, de funções estruturantes e arquiteturas significativas” (p. 102).

Os marcos para Lynch (1997) podem ser definidos de duas maneiras distintas: na primeira, o elemento é visível a partir de muitos outros lugares, portanto, a localização é crucial; e na segunda, fundamental é a existência de contraste local com os elementos vizinhos, pode ser a variação no recuo e/ou altura. Para Boullón (2002, p. 196-197) os marcos são objetos, artefatos urbanos ou edifícios que, pela dimensão ou qualidade de sua forma, destacam-se do resto e atuam como pontos de referência, tais como: um edifício enorme, um monumento, uma fonte, um cartaz de propaganda, uma igreja ou um quiosque de informação ao público.

Os marcos não são trabalhados por Lamas (2000). Ele aponta, entretanto, dois elementos importantes para identificar esta categoria: o monumento e a fachada.

O monumento é um fato urbano singular, individualizado pela sua presença, configuração e posicionamento na cidade e pelo seu significado. Trata-se de um dos elementos que fundamentam o princípio das permanências, pois persistem no tecido urbano e resistem a transformações. Sua existência vai além do desempenho de uma função, assumindo significados culturais, históricos e estéticos.

A fachada é o elemento que evidencia a transição entre o mundo coletivo do espaço urbano e o mundo privado das edificações. Ela exprime as características funcionais da edificação, além da linguagem arquitetônica, moldando a imagem da cidade. De um lado é o invólucro visível de uma edificação, e de outro o cenário que define o espaço urbano.

O estudo de Oba (1998, p. 7), aborda os marcos referenciais urbanos e caracteriza-os como: monumentos, construções, espaços ou conjuntos urbanos com forte conotação de “lugar”, apreendidos por uma grande parcela da população que vê neles uma referência física, cultural, histórica ou psicológica relevante para a construção do seu espaço existencial.

No conjunto eles formam os elementos demarcadores perceptíveis do espaço urbano e sobre os quais se referencia a totalidade construída para o restabelecimento de uma estrutura compreensível e significativa.

Pode-se dizer que um marco significativo para um morador de determinada localidade, nem sempre implica em marcos motivadores de fluxos turísticos, pois exigem familiarização com o meio, alcançada ao longo do tempo.

Os marcos gerais são geralmente mais perceptíveis pelos turistas segundo estudo desenvolvido por Boullón (2002).

Os chamados marcos “locais” refletem o estudo dos elementos de Lynch (1997), que se referem ao observador enquanto morador de dada localidade. Os marcos “gerais” de Boullón (2002), dizem respeito à capacidade de visualização da paisagem na perspectiva do observador-turista. Ao marcos locais podem servir de referência espacial para situar os turistas, quando estes não constituem atrativos turísticos.

Os bairros para Lynch (1997) são espaços de uma cidade com uma extensão bidimencional. Para Boullón (2002) são seções da cidade relativamente grandes, nos quais o turista pode entrar e se deslocar. Como os logradouros e marcos, alguns bairros integram a lista de atrativos turísticos mais visitados em um centro turístico, porque têm a vantagem de possibilitar que, em seu interior, vejam-se outros atrativos turísticos, como uma igreja (marco), ou uma praça e um mercado (logradouros).

Lamas (2000, p. 110) aponta que os elementos morfológicos identificáveis na escala bairro são: os traçados e praças, os quarteirões e monumentos, os jardins e áreas verdes. Nesta escala está embutido o que ele denomina de “dimensão setorial” ou “escala de rua” onde são identificáveis os edifícios (com suas fachadas e planos marginais), o traçado e também a árvore ou a estrutura verde, o desenho do solo e o mobiliário urbano.

Os setores são para Boullón (2002) partes da cidade substancialmente menores que os bairros, mas que têm as mesmas características destes. Às vezes eles não têm mais do que três ou quatro quadras. Em geral, os setores são os restos que permanecem de um antigo bairro, cujas edificações originais foram suplantadas por outras mais modernas, quando essa parte da cidade alcançou um novo valor comercial. Do ponto de vista turístico, os setores são muito importantes porque, se forem valorizados, podem servir para mostrar como foi, um dia, uma cidade ou um povoado em sua etapa de máximo esplendor arquitetônico.

Os limites para Lynch (1997) correspondem às bordas apontadas por Boullón (2002). Trata-se de elementos lineares que marcam o limite entre duas partes de uma cidade.

Uma borda é um elemento fronteiriço que separa bairros diferentes, quebra a continuidade de um espaço homogêneo ou define os extremos ou margens de partes da cidade. As bordas podem ser fortes, como um rio, uma via férrea ou uma autoestrada, separando as partes fisicamente, mas podem também ser fracas, como uma avenida, edifícios de alturas ou idades diferentes e ruas de larguras diferentes, separando as partes apenas visivelmente.

Os roteiros são elementos apontados apenas por Boullón (2002). Eles são as vias de circulação selecionadas para o trânsito turístico de veículos e de pedestres, tendo em vista seus deslocamentos para visitar os atrativos turísticos. Os roteiros de passeio em veículo são aqueles que devem ser selecionados para compor o percurso de city tours e os roteiros para pedestre são os que conectam os atrativos turísticos próximos e definem os circuitos dentro dos bairros.

Os elementos apresentados por Lynch (1997), Lamas (2000) e Boullón (2002), podem ser observados, de forma sintética e comparativa, a partir do Quadro 01. É necessário evidenciar que Lynch e Lamas se remetem ao espaço urbano, apenas Boullón trabalha a questão dos elementos do espaço turístico urbano.

Quadro 01 – OS ELEMENTOS DO ESPAÇO URBANO NUM COMPARATIVO ENTRE AUTORES

LYNCH BOULLÓN LAMAS
CAMINHOS / PONTOS NODAIS LOGRADOUROS RUAS / TRAÇADOS
BAIRROS BAIRROS ESCALA BAIRRO
LIMITES BORDAS ---
MARCOS MARCOS MONUMENTO / FACHADAS /
PRAÇAS / JARDINS / ÁREAS VERDE
--- SETORES ---
--- ROTEIROS ---

ORG.: SIVIERO, A. P., 2005.

É a partir desses elementos, principalmente os apontados por Lynch e Boullón, que o estudo será orientado para verificação empírica.

1.4 PLANEJAMENTO URBANO E PLANEJAMENTO TURÍSTICO: É POSSÍVEL INTEGRÁ-LOS?
Pensar o espaço urbano e toda discussão que permeia o seu uso turístico remete inevitavelmente considerar o planejamento urbano como instrumento de organização espacial e sua integração com o planejamento turístico.

Souza (2002, p. 46) procura diferenciar planejamento e gestão, apontando que o “[...] planejamento é a preparação para a gestão futura, buscando-se evitar ou minimizar problemas e ampliar margens de manobra; e a gestão é a efetivação, ao menos em parte [...] das condições que o planejamento feito no passado ajudou a construir”. Portanto, longe de serem concorrentes ou intercambiáveis estes dois conceitos, embora distintos, são complementares.

Entende-se por planejamento a “definição de um futuro desejado e de todas as providências necessárias à sua materialização” (PETROCCHI, 1998, p. 19). Segundo Molina e Rodriguez (2001, p. 79), “o planejamento é o resultado de um processo lógico de pensamento, mediante o qual o ser humano analisa e estabelece os meios que permitirão transforma-lo de acordo com seus interesses e aspirações”.

Ou seja, buscar ações para uma visão previamente estabelecida de um futuro desejado.

Segundo Souza (2003, p. 48), essa visão futura implica em se construírem cenários que simulem desdobramentos, sem a preocupação de quantificar probabilidades e de tentar “prever” o futuro, como se a história fosse passível de completa determinação, ignorando a contingência que sempre existe nos processos históricos.

O planejamento urbano é uma ferramenta para a promoção do desenvolvimento sócio-espacial, que, segundo Souza (2003, p. 61), pode ser percebido pela melhoria da qualidade de vida e pelo aumento da justiça social no meio urbano. Tradicionalmente, o planejamento urbano vem se utilizando de dois instrumentos fundamentais: os Planos Diretores e os Zoneamentos.

O Plano Diretor pode ser definido como um conjunto de princípios e regras orientadoras da ação dos agentes que constroem e utilizam o espaço urbano.

O objetivo do Plano Diretor é “[...] ser um instrumento para a definição de uma estratégia para a intervenção imediata, estabelecendo poucos e claros princípios de ação para o conjunto dos agentes envolvidos na construção da cidade, servindo também de base para a gestão pactuada da cidade” (BRASIL, 2001, p. 42). Assim, mais do que um documento técnico, normalmente hermético ou genérico, distante dos conflitos reais que caracterizam a cidade, o Plano passa a significar um espaço de debate dos cidadãos e de definição de opções, conscientes e negociadas, por uma estratégia de intervenção do território.

O zoneamento caracteriza-se em uma diretriz do Plano Diretor que consiste em repartir o território de um determinado município em unidades que expressem diferentes destinos espaciais para o uso e ocupação do solo. “O ideal é que o zoneamento produza um conjunto claro e altamente legível de regras fundamentais que orientarão o desenvolvimento da cidade” (BRASIL, 2001, p. 44).

O planejamento é, portanto, uma atividade que tem a intenção de estabelecer condições favoráveis para alcançar os objetivos que foram propostos. Ruschmann (2001, p. 84) acredita que o planejamento do turismo “constitui o instrumento fundamental na determinação e seleção das prioridades para a evolução harmoniosa da atividade, determinando suas dimensões ideais, para que, a partir daí, possa-se estimular, regular ou restringir sua evolução”.

Ignarra (2002, p. 62) defende a idéia de que o planejamento se torna necessário tanto para maximizar os efeitos positivos, quanto e principalmente para que os efeitos negativos sejam mitigados. O planejamento da atividade turística se mostra como um poderoso instrumento de fomento ao desenvolvimento socioeconômico de uma comunidade.

Beni (2001, p. 166) coloca que o planejamento é “o processo de interferir e programar os fundamentos definidos do turismo que, conceitualmente, abrange três pontos essenciais e distintos: estabelecimento de objetivos, definição de cursos de ação e determinação da realimentação, já que a atividade apresenta enorme interdependência e interação de seus componentes”.

O autor reforça a necessidade do planejamento integrado no setor de turismo, indicando, “que todos os seus componentes devem estar devidamente sincronizados e seqüencialmente ajustados”.

Beni (2001) aponta ainda que o planejamento estratégico estabelece os grandes eixos ou bases do desenvolvimento do turismo, podendo ser definido como “o processo destinado a determinar os objetivos gerais do desenvolvimento, as políticas e as estratégias que nortearão os aspectos referentes aos investimentos, ao uso e ao ordenamento dos recursos utilizáveis para este fim” (p. 167).

O planejamento turístico, segundo Ignarra (2002), deve estabelecer estratégias nos seguintes campos: “[...] preparação e conservação dos atrativos turísticos, ampliação e/ou melhoria da infra-estrutura de serviços turísticos, ampliação e/ou melhoria dos serviços urbanos de apoio ao turismo, ampliação e/ou melhoria da infra-estrutura básica, capacitação dos recursos humanos, conscientização da população para a importância turística, legislação de controle de qualidade do produto turístico, legislação de preservação do patrimônio turístico, legislação de fomento a atividades turísticas, captação de investimentos e promoção turística” (p. 67).

Os resultados do processo de planejamento irão depender do entorno econômico, social, político e administrativo, relativo ao conjunto de ações de intervenção sobre uma dada situação ou realidade. O planejamento constitui, portanto, uma forma de aproximação de uma realidade existente a uma realidade desejada, devendo servir como instrumento para satisfação das necessidades humanas e sociais, e promover, o desenvolvimento local. O planejamento urbano, portanto, deve ser abrangente e integrado, sendo o planejamento turístico apenas uma de suas facetas.

1.5 EM BUSCA DE UMA METODOLOGIA DE APREENSÃO DA REALIDADE
A partir destas reflexões teóricas em torno dos conceitos planejamento, turismo e espaço urbano, bem como da articulação existente entre eles, busca-se agora uma aproximação com a realidade. Para tanto, foi definida a área central da cidade de Curitiba como objeto de análise.

Foi a partir do centro de Curitiba, hoje tido como centro histórico, que a cidade começou a desenvolver-se. É, portanto, no centro da cidade que se concentram em Curitiba as mais diversificadas manifestações materiais da cultura.

Estas manifestações podem ser representadas por seus casarios, igrejas, monumentos, praças, ruas etc., que atribuem a esta área uma alta atratividade turística.

A delimitação do centro de Curitiba enquanto objeto de estudo justifica-se também por verificar-se ali todas as fases tanto do processo de crescimento como do planejamento urbano.

A relevância da área central de Curitiba deve-se também ao seu uso intensivo e ao fato desta ser núcleo de suporte urbano. Ali se concentram as atividades econômicas, sobretudo as do setor terciário como o comércio e os serviços, e também os terminais de transporte que possibilitam sua ligação com os demais bairros da cidade. Estes dois fatores provocam na área central um movimento de fluxos tanto de moradores, como também de turistas.

Em termos de paisagem, o centro da cidade se destaca pela sua verticalização, apresentando, portanto, uma ampla escala vertical que lhe atribui uma elevada densidade. Por outro lado, sua escala horizontal é limitada. Desta forma, sua extensão e “limites” torna-o possível de ser percorrido a pé.

O estudo aprofunda-se, portanto, na categoria “bairro” de Lynch e Boullón, representado pelo centro da cidade. Isto não significa negar a complexidade do centro da cidade, que diferentemente dos demais bairros da cidade, extrapola os seus próprios limites com seu acúmulo de funções. Por meio de pesquisas bibliográficas, documentais e empíricas, se buscará primeiramente identificar os diferentes elementos desta área urbana e, num segundo momento, de que forma estes elementos são trabalhados no planejamento urbano e no planejamento turístico. Como uma análise do universo dos “logradouros”, “marcos”, “setores” e “roteiros” da área central tornar-se-ia por demasiadamente exaustiva, optou-se por limitar-se apenas aos bens tombados, ou seja, aqueles que estão sob proteção.

2 O ESPAÇO TURÍSTICO URBANO E SEUS ELEMENTOS: UMA ANÁLISE DO CENTRO DE CURITIBA - PR
A análise dos elementos do espaço turístico do Centro de Curitiba é realizada neste capítulo com base nas pesquisas realizadas por Kevin Lynch (1997) sobre a Imagem da Cidade e nos estudos de Roberto Boullón (2002) sobre o espaço turístico urbano.

A escolha do Centro de Curitiba, enquanto objeto de estudo, não é aleatória. Acredita-se que este “bairro”, por ter vivenciado todas as fases históricas da cidade e do planejamento, e ainda, por seu valor histórico e simbólico, possa melhor contribuir com a tarefa de analisar os bens tombados da área central a partir da interpretação dos elementos urbanos e turísticos indicados pelos autores acima.

Primeiramente, a análise se concentra nos elementos “bairro” e “bordas/limites”, que constituem a área de abrangência desta pesquisa. Num segundo momento a análise se expande para os demais elementos contidos neste “bairro”, quais sejam: “logradouros/caminhos/pontos nodais”, “marcos”, “setores” e “roteiros”.

2.1 O CENTRO COMO “BAIRRO” E “BORDAS/LIMITES”
A delimitação dos bairros além de facilitar a administração pública, tem papel importante para os moradores e visitantes localizarem-se no quadro urbano.

A cidade de Curitiba encontra-se atualmente dividida em 75 bairros, os quais foram agrupados desde 1986 em oito Administrações Regionais (Figura 01). O Centro localiza-se na Administração Regional “Matriz” e limita-se com os bairros do Alto da Glória, Alto da Rua XV, Centro Cívico, Rebouças, Batel, São Francisco e Bigorrilho.

O Centro de Curitiba, segundo o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC, 2003b), possui uma área de 329,7 hectares. Tem como ponto inicial a confluência das Ruas Conselheiro Araújo e Ubaldino do Amaral, segue pela Rua Sete de Setembro, Ruas Desembargador Motta e Professor Fernando Moreira, Alameda Augusto Stelfeld, Travessa Nestor de Castro, Rua Barão do Cerro Azul, Praça 19 de Dezembro, Avenida João Gualberto, Ruas Padre Antônio, Gal. Carneiro e Conselheiro Araújo, até o ponto inicial (Mapa 01).

Em Curitiba pode-se verificar alguns bairros com características sócio-funcionais bem definidas, como o Centro Cívico em sua função político-administrativa e Santa Felicidade em sua função gastronômica e turística. O Centro da cidade possui uma função comercial e de serviços, além de seu valor histórico-cultural. É também o lugar de maiores evidências do passado.

Figura 01 – BAIRROS SEGUNDO AS ADMINISTRAÇÕES REGIONAIS DE CURITIBA




Mapa 01 – CENTRO DE CURITIBA




A denominação – Centro – é uma referência ao núcleo a partir do qual a cidade de Curitiba se expandiu, onde um dos símbolos é a Praça Tiradentes (Foto 01). “Uma pequena capela, uma praça e algumas casas ao redor, delimitavam o núcleo inicial de Curitiba” (TRINDADE, 1997, p. 10).

Foto 01 – IGREJA MATRIZ NA PRAÇA TIRADENTES

Fonte: www.ippuc.pr.gov.br

O Centro de Curitiba é o espaço da cidade onde se pode melhor perceber os diversos períodos que marcaram sua história. Com efeito, e seguindo o curso do processo histórico, a área central testemunhou o avanço do espaço urbano com as suas transformações e modificações inerentes aos períodos mais recentes da modernidade.

A evolução e transformação do Centro de Curitiba acompanham as ações do planejamento urbano que serão detalhadas no próximo capítulo. É válido destacar a preocupação existente com a área central com a finalidade de evitar sua deteriorização, o que levou a proposta de criação de um centro histórico e posteriormente, do tombamento dos edifícios mais antigos (OLIVEIRA, 2000).

A tendência de distanciamento do centro é clara quando se trata de uso residencial.

Há atividades que claramente crescem mais fora do centro, a exemplo, daquelas ligadas a administração pública, que em Curitiba passaram a se concentrar no Centro Cívico. Essa descentralização estimulou a redefinição funcional e social do Centro, configurando-o em local de comércio e serviços.

A área central já não desempenha o papel que desempenhou no passado, por aspectos citados por Horwood e Boyce (apud CORRÊA, 2002), sendo eles:
a) Uso intensivo do solo: o que caracteriza uma maior concentração de atividades econômicas;
b) Ampla escala vertical: a presença de edifícios de escritórios facilmente distinguível na paisagem urbana;
c) Limitada escala horizontal: de acordo com a característica anterior o núcleo central apresenta-se limitado em termos de extensão, passível de ser percorrido a pé;
d) Limitado crescimento horizontal: mais característico de alguns bairros residenciais;
e) Concentração diurna de acordo com o horário comercial de trabalho;
f) Foco de transportes intra-urbanos: ponto de convergência do tráfego urbano e de ligação com os demais bairros;
g) Área de decisões: ponto focal da gestão do território.

Ainda em relação ao ordenamento urbano, o Centro passou por transformações bastante significativas no que diz respeito ao transporte e ao deslocamento.

Apesar de concentrar os principais terminais de transporte coletivo de Curitiba, o que o configura como ponto de ligação e distribuição com os demais bairros, o Centro passou por um processo de pedestrianização. Processo esse que trouxe a transformação de algumas das principais vias de trânsito de veículos em ruas de uso exclusivo de pedestres (OLIVEIRA, 2000), como é o caso da Rua XV de Novembro.

Essa ação serviu como estímulo para que as pessoas se habituassem a freqüentar o Centro a pé.

Uma outra preocupação com o Centro diz respeito ao lazer e as questões ambientais que, por conseguinte, estimularam a criação de parques, áreas verdes e áreas de convívio destinadas a comunidade e que de certa forma conferem atratividade turística a Curitiba.

Dando prosseguimento ao estudo proposto, faz-se necessário compreender a história do Centro de Curitiba. Para tanto, a analise se apoiou em dois momentos, a saber: no primeiro uma análise descritiva da formação inicial da cidade junto a processo de ordenação urbana. O segundo investiga o processo de renovação desta porção da cidade. Outro aspecto analisado é a sua importância no contexto urbano considerado em sua totalidade.

As diferentes fases pelas quais passa o Centro da cidade são oportunamente destacadas em pesquisas realizadas por Villar, para quem [...] a cidade começa no centro e evolui a partir do centro. O centro fragmenta-se, expande-se, desdobra-se e, por último, ele se renova, retornando aos seus espaços originais para resgatar a historicidade plasmada nas formas paisagísticas, nas esferas sociais e nos arranjos espaciais (VILLAR, 2003, p. 02).

Curitiba nasceu ao redor de um pequeno povoado central, mas precisamente no ano de 1693, quando foi criada a Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais.

Já em 1721 essa pequena vila recebeu a visita do ouvidor Rafael Pires Pardinho para instruir a Câmara sobre a administração do município (TRINDADE, 1997). Entre algumas exigências para área central estava a manutenção e preservação, por parte dos moradores, do “Ribeiro” (rio Belém), para evitar que o banhado que se formava a partir dele comprometesse as instalações da Igreja Matriz.

O comportamento de seus habitantes era fiscalizado pela Câmara Municipal e por funcionários ligados diretamente ao governo português, visando estabelecer uma nítida separação entre o ambiente urbano e o rural. Algumas orientações determinavam que a cidade deveria comportar apenas atividades comerciais, artesanais e de moradia.

Apesar de pequena, a região central, em 1783, já recebia alguns cuidados urbanísticos que buscavam a preservação do aspecto público. A região desenvolvia-se no ritmo rendoso do comércio da erva-mate e constituía ponto de passagem para tropeiros. Em 1842, a então vila foi elevada à categoria de cidade.

O ano de 1853 é marcado pela emancipação política do Paraná, e, segundo Menezes (2001), a iminência de tornar-se capital da nova província fez com que Curitiba tentasse estabelecer um perfil de cidade organizada através do controle do uso do solo urbano. Isto implicou, mais tarde, na divisão da cidade em zonas, partindo do centro, cada uma condicionada a uma determinada função, conforme o nível social e econômico da população. “A estratégia era afastar da zona central tudo aquilo que interferisse negativamente na estética e na funcionalidade da cidade” (p. 62).

Ao tornar-se a capital da província do Paraná, em 1854, essa nova condição, incentivou a Câmara Municipal e o Governo do Provincial a considerarem medidas que controlassem as mudanças que inevitavelmente deveriam ocorrer na cidade (TRINDADE, 1997).

A partir daí, alguns moradores já vislumbravam a possibilidade da elaboração de um plano que estabelecesse normas que regulassem o aspecto da forma urbana da cidade, como a largura das ruas, a uniformidade dos quarteirões, o sistema de canalização das águas, a arquitetura das casas, dentre outras diretrizes de ordenamento do espaço urbano.

Enquanto capital, Curitiba deveria ainda, constituir-se em símbolo do poder e gerar uma identidade social, exibindo monumentos e referências culturais que representassem e eternizassem a formação histórica do Paraná (TRINDADE, 1997).

Em 1875, a preocupação com a natureza se torna mais evidente e começam a ser plantadas as primeiras árvores nas praças e ruas de Curitiba. Desde então, cogitava-se a idéia da construção de um jardim botânico na cidade. O primeiro passo foi efetivado em maio de 1886 com a inauguração do Passeio Público, que contemplava os valores estéticos e a criação de um local de lazer em contato com a natureza para os moradores de Curitiba (TRINDADE, 1997). Neste período, as ruas ainda se misturavam com as características do meio rural, onde plantações sobrepunham-se as áreas residenciais do Centro.

Esse cenário começou a transformar-se mais nitidamente por volta de 1904, quando a tecnologia e os aparelhos mecânicos chegavam da Europa e o Centro da cidade ganhou, para aquele momento, aspecto mais moderno. A população curitibana recebia melhorias na sua infra-estrutura urbana através da substituição dos calçamentos de pedras irregulares por paralelepípedo, petit-pavé e outros, e logo, pelo calçamento e, na seqüência, o asfalto. Vieram ainda, os bondes elétricos (Foto 02), a iluminação pública e os automóveis (TRINDADE, 1997).

Foto 02 – BONDE ELÉTRICO UTILIZADO PARA TRANSPORTE DE PASSAGEIROS NO INÍCIO DO SÉCULO XX

Fonte: http://www.ecofantascienza.it/articoli/img/curitiba3.jpg

A rua XV de Novembro – principal logradouro da cidade – também passou por modificações em seu nivelamento e recebeu ainda passeios em mosaico e novas edificações, diversificando este espaço com cafés e salas de espetáculo, parques e praças, em prol do lazer urbano.

Em 1919, foi criada a Universidade Federal do Paraná, na Praça Santos Andrade, considerada a universidade mais antiga do país (Foto 03). Foi neste período que discussões surgiram para um novo plano urbanístico que viesse a contribuir para a reorganização da cidade (IPPUC, 2004).

Foto 03 – UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

Fonte: www.ippuc.pr.gov.br

Vale ressaltar que Curitiba teve sua história marcada pela preocupação com as normas de conduta, sobretudo, após a década 1910. Apregoava-se que os mais diversos atores sociais eram responsáveis pela manutenção de um ambiente urbano sadio, onde, a população deveria dotar-se de atitudes revestidas de “urbanidade” e “civilidade” (TRINDADE, 1997, p. 32).

Nessa época, o principal instrumento de “urbanidade” era o Código de Posturas do Município – reformulado posteriormente em 1919, por meio da Lei nº 527 – que definia arruamentos, alinhamentos prediais, técnicas de construção, normas de higiene e saneamento, arborização e regras de comportamento. O código proibia atividades consideradas nocivas à cidade, o que implicaria em barreiras para a industrialização que como processo estava em expansão.

Questões ambientais também estavam sendo objeto de atenção, segundo o artigo 143 do Código de Posturas, proibindo-se o corte, ou a derrubada, de matas protetoras de mananciais, ou que defendam o solo da invasão de qualquer curso d’água (TRINDADE, 1997, p. 34).

Até o ano de 1930, a população, junto com os administradores municipais, discutia a necessidade de um desenvolvimento da cidade rumo à modernização, tomando como base outras capitais, como São Paulo, e ainda, cidades e modelos urbanos europeus. Segundo Trindade (1997), esse era o momento de repensar o urbano.

A década de 1940 marca uma nova fase nos destinos da urbanização e do tratamento da questão urbana em Curitiba. Menezes (2001) salienta que, pela primeira vez, a cidade sofre uma intervenção urbanística, seguindo concepções teóricas sob forma de elaboração de um plano de desenvolvimento urbano. O primeiro plano urbanístico de Curitiba, o Plano Agache, elaborado em 1942-43 pelo urbanista francês Alfred Agache contratado pela Coimbra Bueno & Cia, destaca-se não apenas pela questão higiênico-funcional, mas também pela concepção orgânica da cidade, pela estruturação viária, pela preocupação estética e com a monumentalidade, definindo a cidade em diferentes zonas funcionais: um centro comercial (o centro tradicional), um centro administrativo (atual Centro Cívico), um centro universitário (hoje, o Centro Politécnico da UFPR) e um centro militar (onde hoje localizam-se a base aérea do Bacacheri e outras instalações militares)(TRINDADE, 1997, p. 48). Devido aos problemas financeiros e às ocupações irregulares, o Plano Agache nunca foi implantado em sua totalidade (OBA, 1998, p. 292).

Até o ano de 1960, o crescimento populacional de Curitiba caracterizou-se pelo extravasamento de seu núcleo primitivo. O Centro da cidade, com o esgotamento de áreas disponíveis e sua crescente especialização como área prestadora de serviço e comércio, começa a provocar a ocupação de bairros limítrofes. Já em 1970 inicia-se um processo que em 1980 consolida-se como modelo de ocupação da periferia, quando o bairro Boqueirão torna-se o mais populoso (IPPUC, 2004). Neste contexto, o bairro Centro começa a perder sua importância em termos populacionais como pode-se verificar no quadro 02, que apresenta, entre outros fatores, taxas de crescimento populacional negativas a partir da década de 1980.

Quadro 02 – POPULAÇÃO ABSOLUTA, DENSIDADE DEMOGRÁFICA E TAXA DE CRESCIMENTO DO CENTRO DE CURITIBA - 1970, 1980, 1991 E 2000
Ano 1970 1980 1991 2000
Pop. Absoluta (hab.) 37.086 42.371 37.003 32.623
Densidade Dem.(hab./ha) 112,5 128,5 112,2 98,9
Tx. Cresc.(%) 14,3 - 12,7 -11,8
Fonte: IBGE - Censos Demográficos 1970 a 2000 / Org.: SIVIERO, A. P.

Nas décadas de 1960 e 1970, a população da área central aumenta, tanto em termos absolutos quanto em termos relativos. Entretanto, a partir de 1980 existe uma tendência declinante desta. A redução do número de habitantes e também da densidade demográfica ocorre em virtude da perda crescente de sua função residencial (IPPUC, 2004).

Em 1970, a população de Curitiba era de 609.026 habitantes, dessa monta, cerca de 6% residiam na área central. No último censo do IBGE (2000), Curitiba atingiu os 1.587.315 habitantes, destes apenas 0,5% moram no centro da cidade. Estes dados reforçam também a importância crescente que os demais bairros da cidade vêm assumindo no que se refere à função residencial.

No ano de 1980 a Cidade reorganizou a implantação de equipamentos sociais em áreas periféricas e incentivou a gestão compartilhada através da criação de mecanismos de participação popular. Curitiba chega em 1980 com uma população de pouco mais de um milhão de habitantes. Ainda nesta época, a cidade produziu um amplo diagnóstico, utilizando como ferramenta de planejamento o Plano Municipal de Desenvolvimento Urbano (IPPUC, 2004), que propunha diretrizes para um modelo de desenvolvimento.

O ano de 1990 apresenta uma taxa de crescimento populacional de aproximadamente 2,29%, valor inferior à taxa apresentada na década anterior. Curitiba inicia o ano de 1990 com 1,3 milhão de habitantes (IPPUC, 2004). Nesta década, as discussões sobre poder e desenvolvimento local são ampliadas, através de seminários internacionais e da troca de experiências bem sucedidas entre as cidades. Na década de 1990, a cidade se transforma na Capital Ecológica do Brasil. São criados seis novos parques, o Jardim Botânico e oito bosques, que somados totalizam mais de oito milhões de metros quadrados em áreas verdes públicas (IPPUC, 2004).

Outra mudança significativa diz respeito ao crescimento dos equipamentos e espaços culturais. Nesse período, foram inaugurados o Conservatório de Música Popular Brasileira de Curitiba, os teatros Novelas Curitibanas, de Bonecos Dadá, e a Ópera de Arame (inaugurada em 1992, ano em que começa o I Festival de Teatro de Curitiba que passa a ser anual), a Casa Vermelha, a Casa dos 300 Anos e o Memorial da Cidade - como síntese das comemorações dos 300 anos de Curitiba (IPPUC, 2004).

Parques, bosques temáticos e memoriais homenageiam as várias etnias que compõem a população curitibana. São construídos os memoriais Ucraniano, Árabe, da Imigração Alemã, da Imigração Japonesa, o Bosque de Portugal e o Italiano. Na década de 1990, a Cidade conviveu com um novo processo de valorização de áreas históricas. Em 1994, o Centro Histórico foi palco do projeto ‘Cores da Cidade’, em parceria com a Fundação Roberto Marinho (IPPUC, 2004). Em 1997, a área Central da Cidade é revitalizada. A Rua XV de Novembro - o calçadão implantado em 1971 - é remodelada.

Na última década o centro de Curitiba foi palco de sucessivas renovações urbanas, isto ocorreu na Rua XV de Novembro, na Praça Osório e também no Largo da Ordem. Este processo de renovação urbana de áreas centrais salientou o contraponto entre o passado e o presente, além de proporcionar ofertas culturais e espaços de entretenimento.

O Centro aparece, assim, como um núcleo forte, onde se encontram manifestas todas as épocas e marcas deixadas pela história. A história do Centro se confunde com a história de Curitiba nos primeiros tempos e passa a ser palco de transformações acentuadas nas décadas que se sucedem. Elementos destas diferentes épocas convivem, lado a lado, neste espaço turístico urbano. Estes elementos serão analisados na seqüência.

2.2 OS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURISTICO DO CENTRO
Utilizando-se o Centro de Curitiba enquanto objeto de estudo, ou seja, analisando-se os elementos “bairro” e “limites/bordas” do espaço urbano, procurou-se identificar os elementos deste espaço, como “logradouros”, “marcos”, “setores” e “roteiros”.

Buscou-se salientar os elementos de relevância turística, ou seja, aqueles que demonstram a existência de fatores capazes de movimentar fluxos de pessoas, configurando-se como atração potencial para o desenvolvimento do turismo.

Os elementos com potencial para a prática do turismo, e por extensão o lazer, permitem que sejam implementados projetos urbanísticos e turísticos, valorizando o espaço urbano em questão.

Como uma análise do universo dos “logradouros”, “marcos”, “setores” e “roteiros” da área central tornar-se-ia por demasiadamente exaustiva, optou-se por limitar-se apenas aos bens tombados, ou seja, aqueles que estão sob proteção. O tombamento é um ato administrativo realizado pelo Poder Público com o objetivo de preservar, por intermédio da aplicação de legislação específica, bens de valor histórico, cultural, arquitetônico, ambiental e também de valor afetivo para a população, impedindo que venham a ser destruídos ou descaracterizados.

O tombamento pode ser aplicado aos bens móveis e imóveis, de interesse cultural ou ambiental, quais sejam: fotografias, livros, mobiliários, utensílios, obras de arte, edifícios, ruas, praças, cidades, regiões, florestas, cascatas etc. Somente é aplicado aos bens materiais de interesse para a preservação da memória coletiva (IPHAN, 2005).

Assim, para a análise dos elementos do espaço turistico do Centro, classificaram-se os bens tombados de acordo com a proposta de Lynch (1997) e Boullón (2002) - (Quadro 03).

O tombamento pode ser feito pela União, por intermédio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, pelo Governo Estadual, por meio do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado ou pelas administrações municipais, utilizando leis específicas ou a legislação federal.

Quadro 03 – CLASSIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURÍSTICO URBANO: BENS TOMBADOS DA ÁREA CENTRAL DE CURITIBA

ELEMENTO DENOMINAÇÃO TOMBAMENTO FINALIDADE ATUAL
Parque Passeio Público Estadual, 1999 Parque
Antigo Paço Municipal Estadual, 1966 / SPHAN, 1984 __
Sobrado – R. Mateus Leme, 336 Estadual, 1971 Museu Casa Alfredo Andersen
Acesso ao Passeio Público / Portão do Passeio Público Estadual, 1974
Primeira Sede da UFPR Estadual, 1975 Comércio
Antigo Palácio do Governo Estadual, 1977 Museu da Imagem e do Som
Antigo Gymnasio Paranaense Estadual, 1977 Secr. do Est. da Cultura
Antigo Tesouro do Estado Estadual, 1977 Museu Casa Andrade Muricy
Casa Emílio Romani Estadual, 1977 __
Solar do Barão do Serro Azul Estadual, 1977 Casa da Gravura (ativ. cult.)
Sobrado – R. Westphalen, 16 Estadual, 1977 Museu de Arte Contemporânea
Sede Centro Acad. Hugo Simas Estadual, 1990 Comércio
Sobrado – R. Br. do Rio Branco, nº 763. Estadual, 1985 Comércio
Sobrado – R. Br. do Rio Branco, nº 773. Estadual, 1985 Sem uso
Sobrado – R. Br. do Rio Branco, nº 805. Estadual, 1985 Hotel
Sobrado - R. Br. do Rio Branco, nº 823. Estadual, 1985 Sem uso
Palácio São Francisco Estadual, 1987 Museu Paranaense
Teatro Treze de Maio Estadual, 1988 Teatro
Colégio Estadual do Paraná Estadual, 1994 Colégio
MARCO
Edificação
Conj. de Edifícios da Reitoria da UFPR Estadual, 1999 Universidade
Casa Romário Martins Estadual, 1971
Centro Cultural, Arquivo Histórico da cidade
Igreja da Ordem III de São Francisco de Chagas
Estadual, 1966
Culto Religioso e Museu de Arte Sacra
SETOR I
Edificação Palacete Wolf Estadual, 1981 Fundação Cultural de Curitiba
Praça Pç. Eufrásio Correia Estadual, 1985 Praça
S. II
Edificação Antiga Estação Ferroviária Estadual, 1976 Museu Ferroviário
Edificação Palácio Avenida (fachada) Estadual, 1990 Banco HSBC
Paisagem Urbana da Pç. Ozório Diversas Praça
Paisagem Urbana da Pç. Santos Andrade Diversas
Paisagem Urbana da Av. Luis Xavier Diversas

ROTEIRO (Interpreta-se que este é um roteiro potencial.)
Paisagem Urbana da R. XV de Novembro Estadual, 1974 Diversas

Ft: SOUZA e LYRA, 1994; IPHAN – 10ª Sup. Reg. de Ctba., 2005. /Org.: SIVIERO, A. P.

Um único “logradouro” foi identificado entre os bens tombados, trata-se do Passeio Público. Neste destaca-se o Portão de acesso, também tombado e interpretado como um marco. Ele é o primeiro parque público de Curitiba, e o mais central, foi inaugurado pelo então presidente da Província do Paraná, Alfredo d’Escragnolle Taunay, em 2 de maio de 1886, com cerca de 70 mil m² de mata natural, nas margens do rio Belém.

Foi a primeira grande obra de saneamento da cidade, transformando um charco num espaço de lazer, com lagos, pontes e ilhas em meio ao verde. Na época sua iluminação era feita por lampiões alimentados por azeite de peixe (CURITIBA, 2004).

No século XIX, o Passeio Público foi por algum tempo o Jardim Botânico de Curitiba.

Foi, também, o primeiro Zoológico e, até hoje, possui alguns animais em cativeiro, além de um aquário. Seu portão é cópia do que existiu no Cemitério de Cães de Paris (CURITIBA, 2004). Este parque representa hoje mais uma opção de lazer urbano na cidade, onde a natureza confronta-se com a paisagem urbanizada de seu entorno.

O espaço físico do parque abriga pequenos animais, pista para caminhada, bar e banheiros, lago com ilhas, uma gruta, ponte pênsil, palco flutuante e é cortado pela malha cicloviária da cidade.

Dezenove edificações foram interpretadas como “marcos”, de acordo com os elementos do espaço urbano, apontados por Lynch (1997) e Boullón (2002). Os marcos encontram-se dispersos na área central e muitos deles tem uso cultural.

Dos marcos urbanos identificados na área central, apresenta-se a descrição daqueles que desempenham função cultural, como é o caso do Antigo Paço Municipal.

Até 1914 funcionava na Praça Generoso Marques o antigo Mercado Municipal, que então foi demolido. A sede do Paço Municipal foi inaugurada em 1916. Oficialmente foi chamado de Paço da Liberdade a partir de 1948. Sediou a Prefeitura até 1969, quando esta foi transferida para a nova sede no bairro Centro Cívico.

Em 1970 o prédio deu início a um processo de restauração pelo arquiteto Cyro Corrêa de Oliveira Lyra, passando, em 1974, a abrigar o Museu Paranaense, oficialmente inaugurado em 1876 em outro local (SOUZA e LYRA, 1994). O Antigo Paço Municipal abrigou o Museu Paranaense até o final da década de 1990, quando foi transferido para o Palácio São Francisco.

Dentre as edificações que desempenham papel cultural pode-se destacar também o Sobrado situado à Rua Mateus Leme, que abriga o Museu Casa Alfredo Andersen.

O prédio, que por muitos anos serviu de moradia e ateliê-escola para o artista plástico Alfredo Andersen, abriga uma exposição em caráter permanente com a coleção de obras e documentos do artista, que é considerado ‘pai’ da pintura paranaense pela sua importância didática (SOUZA e LYRA, 1994).

O Antigo Palácio do Governo sediou, entre 1892 e 1938, o Governo do Paraná, e posteriormente, por mais de trinta anos, a Secretaria do Interior e da Justiça.

Atualmente abriga o Museu da Imagem e do Som (SOUZA e LYRA, 1994). Criado em 1969, o Museu ficou desativado de 1980 a 1984, voltando a funcionar em 1985. Tem como finalidade preservar e resgatar a memória audiovisual do Paraná através de discos, filmes, fitas de áudio e de vídeo, depoimentos e registros da história oral, partituras, fotografias, documentos e equipamentos fotográficos e de som (CURITIBA, 1987).

O Antigo Tesouro do Estado, edifício de 1925, já teve vários usos, abrigando a Coletoria Estadual, a Repartição de Água e Esgotos e a Junta Comercial do Estado.

Posteriormente, passou a sediar a Secretaria de Finanças e ainda, as Coordenadorias do Patrimônio e dos Museus, subordinadas à Secretaria da Cultura (SOUZA e LYRA, 1994). Hoje abriga o Museu Casa Andrade Muricy (IPHAN, 2005).

Outra edificação identificada como marco é o Solar do Barão do Serro Azul, construído em 1885 e que pertenceu a Ildefonso Correia, Barão do Serro Azul, empresário e político no Império. A casa passou por modificações na primeira metade do século XX, mas que não chegaram a descaracterizá-la. Na segunda metade deste mesmo século, entretanto, passou por uma reforma mais radical perdendo muito de suas características originais (SOUZA e LYRA, 1994).

Ao passar à propriedade municipal em 1975, a casa foi restaurada sob a direção do arquiteto Cyro Corrêa de Oliveira Lyra, que baseado em documentação iconográfica e em elementos remanescentes, reconstituiu as fachadas, espaços internos, além de pinturas, sob a orientação da restauradora Maria Ester Teixeira Cruz (SOUZA e LYRA, 1994). Hoje a casa recebe o nome de ‘Casa da Gravura’ e desempenha atividades culturais.

O sobrado situado na Rua Westphalen, que hoje abriga o Museu de Arte Contemporânea, foi projetado para ser sede da Diretoria de Saúde do Estado, tendo sua construção iniciada em 1926 e inaugurado em 1928. Posteriormente foi ocupado pela Secretaria de Trabalho e Assistência Social, até 1973, quando foi restaurado para abrigar o Museu de Arte Contemporânea, o da Imagem e do Som e o Conselho Estadual de Cultura (SOUZA e LYRA, 1994).

O Museu de Arte Contemporânea que permanece no prédio, abriga um acervo formado por pinturas, esculturas, desenhos, gravuras etc., de artistas brasileiros, em especial paranaenses, tendo por finalidade preservar e divulgar a arte contemporânea. Possui atualmente cerca de 600 obras. O museu dispõe ainda de uma biblioteca especializada em artes plásticas e um auditório com capacidade para cem pessoas. Foi criado em 1970, sendo que desde 1974 se encontra na atual sede, que em 1978 sofreu ampla reforma e restauração (CURITIBA, 1987).

Um outro marco que desempenha função cultural no Centro de Curitiba, também tombado pelo Patrimônio Histórico e Artístico do Paraná em 1988, é Teatro Treze de Maio, com a apresentação de diversas peças.

Dois “setores” de bens tombados foram verificados: o primeiro ao redor do Lago da Ordem, e o segundo imediações da Antiga Estação Ferroviária. O primeiro setor identificado é o Largo da Ordem, seu nome oficial é, desde 1917, Largo Coronel Enéas, em homenagem ao coronel Benedito Enéas de Paula. Nele destacam-se três edificações de uso cultural: a Casa Romário Martins, a Igreja da Ordem III de São Francisco de Chagas e o Palacete Wolf.

A casa Romário Martins representa um dos últimos exemplares da arquitetura colonial remanescente no Setor Histórico de Curitiba. A edificação foi ocupada por pequeno armazém de secos e molhados além de um anexo lateral, onde funcionava uma peixaria.

Quando a Casa incorporou o Plano de Revitalização do Centro Histórico de Curitiba - Elaborado em 1970 pelo IPPUC a partir das diretrizes traçadas pelo Plano Diretor de Curitiba de 1966, que prevê uma política municipal de preservação do patrimônio histórico e cultural da cidade (www.ippuc.pr.gov.br), seu uso foi previsto para transformar-se em uma sala de exposições pelo que se criou uma galeria ao redor do núcleo central. Ao arquiteto Cyro Corrêa de Oliveira Lyra coube a elaboração do projeto e a direção das obras de restauração, que se desenvolveram durante o ano de 1973. Neste mesmo ano, a Casa Romário Martins foi inaugurada. Sua fachada foi restaurada, voltada para o Largo da ordem, e eliminou-se o tráfego de veículos em frente da casa. O Largo recuperou parcialmente sua ambientação antiga, polarizada cultural e socialmente pela Igreja da Ordem e pela Casa Romário Martins.

A restauração dos dois prédios – a casa e a igreja, a eliminação do tráfego e a utilização do espaço para feira de artesanato aos domingos, transformaram a área, valorizando-a como setor cultural e de lazer (SOUZA e LYRA, 1994).

A Igreja da Ordem III de São Francisco de Chagas, também incorporou o Plano de Revitalização do Centro Histórico de Curitiba (SOUZA e LYRA, 1994). A Igreja da Ordem Terceira de São Francisco das Chagas – ou simplesmente Igreja da Ordem – é o principal ponto de referência do Largo Coronel Enéas, ou Largo da Ordem, no centro do Setor Histórico. Construída em 1737, foi restaurada duas vezes: em 1880, para a visita do Imperador Pedro II ao Paraná; e em 1978, dando origem a I Festa de São Francisco da Ordem, quermesse anual comunitária que até hoje ajuda os mais carentes.

Mantendo suas características originais, a Igreja da Ordem é a mais antiga edificação católica em pé da capital, e abriga o Museu de Arte Sacra. A peça mais valiosa do acervo é o altar-retábulo lateral da antiga Matriz, um resgate do passado barroco da cidade. Há relíquias das principais igrejas de Curitiba: a da Ordem Terceira, da Catedral Metropolitana, de Nossa Senhora do Rosário e a de São Francisco de Paula. Em seu acervo existem peças preciosas como a imagem de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais, a do Bom Jesus dos Pinhais e a de Nossa Senhora do Terço, entre outras peças. Existe ainda um espaço reservado às exposições temporárias (CURITIBA, 1987).

O Palacete Wolf também merece destaque no Setor Histórico. Sua história está ligada a José Wolf, imigrante de origem austríaca que chegou ao Brasil em 1858, e que naquele ano montara em Curitiba sua primeira cervejaria, e que, em 1875, requereu ‘cem palmos’ de terreno no Largo da Igreja do Rosário para construir um edifício. Entre 1889 e 1895 o prédio serviu ao Quartel-General do Quinto Distrito do Exército brasileiro e dez anos depois da saída do quartel, a casa foi alugada ao Colégio Bom Jesus, permanecendo até 1911. Vários locatários sucederam a ocupação do prédio até 1974, quando Jaime Lerner, então Prefeito de Curitiba, tomou a iniciativa de promover sua desapropriação para instalar a Fundação Cultural de Curitiba, a qual permanece no prédio até hoje.

O segundo “setor” identificado localiza-se nas imediações da Antiga Estação Ferroviária, destacando-se a Praça Eufrásio Correia e Antiga Estação Ferroviária, hoje Museu Ferroviário. A Praça Eufrásio Correia remonta ao final do século XIX com o desenvolvimento da área urbana ao sul da atual Rua XV de Novembro, como núcleo dinamizador da cidade, a partir da construção da Estação Ferroviária (SOUZA e LYRA, 1994). A inauguração da ferrovia, em 1885, que unia Curitiba ao porto de Paranaguá, contribuiu decisivamente para a transformação do entorno, que foi sendo ocupado por instalações industriais e de comércio exportador.

Com a dinamização da área, não apenas por atividades econômicas mas pela movimentação de passageiros, a Praça Eufrásio Correia – o nome da praça evoca o parnanguara Manoel Eufrásio Correia, deputado provincial e presidente da Assembléia (SOUZA e LYRA, 1994) – assume o papel de principal ponto de encontro da cidade, e a antiga Rua da Liberdade, hoje Barão do Rio Branco, unindo o largo ao centro tradicional, a função de principal artéria urbana, sendo nesta implantada a estação dos bondes (SOUZA e LYRA, 1994).

A transformação da área em centro político e comercial da cidade, juntamente com a concessão de licença municipal à instalação de diversos tipos de comércios na praça e em seus arredores, atraiu vários hotéis, a maioria pertencente a alemães e italianos, dedicados a hospedagem de imigrantes, comerciantes e políticos (SOUZA e LYRA, 1994).

Contudo, o desenvolvimento do transporte rodoviário e a construção da Estação Rodoferroviária em outro local marcaram o fim do papel polarizador da Praça Eufrásio Correia, porém, manteve a mesma escala urbana com a sobrevivência dos edifícios que balizavam seus limites: a Casa Emílio Romani, a antiga Assembléia, alguns sobrados e a antiga Estação Ferroviária. Ganhou ainda uma das mais belas esculturas do artista paranaense Zacco Paraná, ‘O Semeador’, oferecido pela colônia polonesa (SOUZA e LYRA, 1994).

A construção da ferrovia ligando Curitiba a Paranaguá iniciou-se em 1880, porém só nove anos depois foi concedido o terreno, pela municipalidade, para construção da estação ferroviária (SOUZA e LYRA, 1994). O projeto da estação coube ao engenheiro italiano Michelangelo Cuniberti. Em 1984 o edifício sofreu uma ampliação e ganhou mais um pavimento. Com a transferência, em 1918, dos escritórios da companhia para outro local, passou o edifício por modificações que incluíram a criação de um salão nobre. Após a inauguração da rodoferroviária, na década de 1970 e a desativação da estação, foi nela instalado o Museu Ferroviário (SOUZA e LYRA, 1994).

O acervo do museu é composto por instrumentos usados no transporte ferroviário como aparelhos de topografia, aparelhos de telégrafo e telefones, usados por ferroviários que trabalhavam na estrada de ferro do Paraná no início do século XX, além de maquetes de composições, apitos de trens, faróis sinalizadores, manômetros de pressão, balanças, relógios de estações. Além disso, existem medalhas, fotografias e publicações (CURITIBA, 1987).

Como “roteiro” tem-se, entre os bens tombados, o trecho do centro da cidade que abrange duas praças – Ozório e Santos Andrade – ligadas por uma via com duas denominações – Rua XV de Novembro e Avenida Luis Xavier.

A ocupação desta área deu-se na segunda metade do século XIX, com o enriquecimento da cidade durante o ciclo do mate. Quando em 1880 D. Pedro visitou Curitiba, a rua, pavimentada e iluminada à gás (SOUZA e LYRA, 1994), foi rebatizada como Rua da Imperatriz, nome substituído após a Proclamação da República para Rua XV de Novembro. Nessa época o casario térreo que predominava na área foi substituído por sobrados de uso comercial e residencial, o que, ao final do século XIX, até os anos trinta do século XX, consolidou três funções básicas desse espaço: comércio, habitação e lazer, identificando-o como eixo comercial, cultural e de convivência social (SOUZA e LYRA, 1994). A interdição ao tráfego de veículos em 1972 pelo então prefeito Jaime Lerner modificou o panorama da via pública pela substituição dos asfalto pelo mosaico.

A Avenida Luis Xavier é o nome dado à extremidade da Rua XV de Novembro, em que a largura da via é maior (SOUZA e LYRA, 1994). É conhecida pela sua reduzida extensão, com pouco mais de uma centena de metros de comprimento. Sua vocação de lazer iniciou-se em 1916, com a instalação do Palace Theatre – casa de diversões para apreciadores de patinação. Entre os anos de 1929 e 1959, foram inaugurados o Cine Teatro Avenida, o Cine Palácio e o Cine Ópera (SOUZA e LYRA, 1994). Destacam-se na avenida dois edifícios: o Palácio Avenida e o Moreira Garcez, que foram os primeiros prédios de apartamentos e escritórios da cidade.

Em 1990 o Palácio Avenida que antes abrigava o restaurante Guairacá, o Café Alvorada e o Cine Teatro Avenida, além de apartamentos nos três pisos superiores, foi parcialmente demolido mantendo-se sua fachada principal por força do tombamento (SOUZA e LYRA, 1994). Passou então a abrigar o Banco Bamerindus – patrocinador da obra, hoje Banco HSBC, que hoje integra uma das principais atrações do Natal de Curitiba, que desde 1991 se tornou um dos cartões postais natalinos da cidade.

Todos os anos o banco enfeita completamente sua sede, o histórico prédio Palácio Avenida, com mais de 100 mil minilâmpadas para a decoração (Foto 04). Além disso, o prédio recebe um laço, se transformando em um enorme presente de Natal. Esse presente é oferecido para toda a população que vai assistir às apresentações do coral de crianças que se apresentam nas janelas da construção (SANT’ANNA, 2005).

FOTO 04 – PALÁCIO AVENIDA DECORADO PARA O NATAL

Fonte: http://www.curitiba.pr.gov.br/

A Praça Osório, na extremidade da Avenida Luis Xavier, é expressiva pelo agenciamento dos equipamentos recreativos em um espaço desenhado no século XIX e pela presença de arborização de grande porte. O desenho da praça apresenta esquema radial tendo como elemento central um chafariz em ferro (Foto 05) de origem francesa (SOUZA e LYRA, 1994).

FOTO 05 – CHAFARIZ DA PRAÇA OSÓRIO



Fonte: SIVIERO, A. P., 2005. Acervo pessoal.

No ano de 1970 a prefeitura introduziu nesse espaço um play-ground para atender as necessidades da população infantil residente no centro. Algum tempo depois brinquedos em ferro e madeira de cores primárias desenhados pelo arquiteto Orlando Busarello foram montados neste local (SOUZA e LYRA, 1994). Alterações recentes no espaço retiraram esses equipamentos do local.

A Praça Santos Andrade, na outra ponta do trecho tombado, tem como um dos elementos principais o prédio da Universidade Federal do Paraná e na outra extremidade, o Teatro Guaíra, principal casa de espetáculos da cidade, com capacidade para duas mil pessoas, projetado na década de cinqüenta do século passado, pelo engenheiro Rubens Meister e construído no final dos anos setenta. Os dois outros lados da praça são ocupados por edificações de comércio e residência (SOUZA e LYRA, 1994).

Quadro 04 – FOTOS DOS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURISTICO URBANO DA ÁREA CENTRAL DE ACORDO COM A CLASSIFICAÇÃO DE LYNCH (1997) E BOULLÓN (2002)

ELEMENTOS DO ESPAÇO URBANO
Foto 06 - Portão do Passeio Público

Fonte: www.ippuc.pr.gov.br

MARCO
Foto 07 - Sobrado – R. Westphalen, 16 – Museu de Arte Contemporânea

Fonte: SIVIERO, A. P., acervo pessoal.

Foto 08 - Casa Romário Martins

Fonte:www.curitiba.pr.gov.br

SETOR I
Foto 09 - Igreja da Ordem III de São Francisco de Chagas

Fonte:www.curitiba.pr.gov.br

Foto 10 - Palacete Wolf – Fundação Cultural de Curitiba

Fonte:www.curitiba.pr.gov.br

SETOR II
Foto 11 - Antiga Estação Ferroviária – Museu Ferroviário

Fonte: SIVIERO, A. P., acervo pessoal.

ROTEIRO - Praça
Foto 12 - Paisagem Urbana da Pç. Santos Andrade

Fonte:www.curitiba.pr.gov.br
FONTE: SIVIERO, A. P., 2001(acervo pessoal); www.curitiba.pr.gov.br; www.ippuc.pr.gov.br. / ORG.: SIVIERO, A. P., 2005.

A análise dos bens tombados no centro de Curitiba demonstra a relevância histórico-cultural dos elementos urbanos, que se traduzem em potenciais ao desenvolvimento do chamado turismo cultural.

“Turismo Cultural refere-se à afluência de turistas a núcleos receptores que oferecem como produto essencial o legado histórico do homem em distintas épocas, representando a partir do patrimônio e do acervo cultural, encontrado nas ruínas, nos monumentos, nos museus e nas obras de arte” (BENI, 2002, p. 422).

Isso não implica dizer que esta seja a única vocação turística verificada no centro de Curitiba, contudo é a com maior potencial a prática do turismo. Nesta área os atrativos – os bens históricos – já existem, não é preciso criá-los, apenas planejar
sua exploração, agregar valor turístico e transformá-los em produtos que apresentem uma especificidade própria e que imprimam ao núcleo receptor sua vocação turística e seu conseqüente poder de atração. Pode-se afirmar que o Turismo serve como instrumento de veículo à reabilitação das culturas, configurando-se como uma forte alternativa para os núcleos urbanos preservados, pois sua base, segundo Simão (2001), é a própria preservação do patrimônio e da cultura local, estabelecendo uma relação intrínseca de existência.

Além dos bens tombados, outros elementos urbanos compõem o patrimônio histórico-cultural do Centro de Curitiba, com forte vocação para a motivação de fluxos turísticos. Grande parte destes elementos estão dispostos no Setor Histórico, também na área central da cidade. Contudo, as formas de utilizar o tempo e os espaços precisam ser aperfeiçoados e/ou maximizados, onde o envolvimento de todos os segmentos sociais no processo de implantação da atividade turística é determinante para o nível de sucesso ou insucesso da atividade. A população, na maioria das vezes, desconhece o valor de seus bens e ainda não compreende as possibilidades que o turismo oferece.

Primeiramente, há que se promover um trabalho de promoção interna, almejando o resgate do orgulho pelo lugar. Não se pode pensar em potencializar o turismo em local que é descrente de si mesmo, que não tem orgulho pelo que tem e o que é.

Mobilizar todos os atores da cidade e fazer por acontecer ações imediatas, catalizadoras da opinião pública são estratégias que vem demonstrando eficácia [...]. O processo de identificação, formatação e divulgação da imagem da cidade pode tornar-se também, uma forma de promoção interna, motivando os cidadãos ao (re)conhecimento de seu lugar (SIMÃO, 2001, p. 69).

Esse valor atribuído aos bens históricos faz parte do que se pode chamar de patrimônio turístico de uma localidade e que, se bem trabalhados e planejados, podem se transformar em produtos de considerável potencial de comercialização.

Segundo Dias, “a atratividade das cidades neste início do século XXI decorre pois da diversidade cultural existente nas zonas urbanas, o que permite a elaboração de políticas urbanas que levem em consideração o turismo cultural como um valioso instrumento de para a regeneração urbana em todos os seus aspectos” (2003, p. 172).

Segundo Sánchez (1999, p. 115) o “city marketing constitui-se na orientação da política urbana à criação ou ao atendimento das necessidades do consumidor, seja este empresário, turista ou o próprio cidadão”. Em outras palavras, é uma promoção da cidade que objetiva atingir os seus próprios habitantes bem como os possíveis e eventuais investidores, que busca a construção de uma nova imagem da cidade, dotada de um forte impacto social. A cidade passa a ser vista como um espetáculo.

No Brasil, Curitiba é a cidade que melhor retrata esse processo: “Curitiba: a cidade que não pára de inovar”, que nos anos 70 era a “Cidade Modelo”, nos anos 80 a “Capital da Qualidade de Vida”, nos anos 90 a “Capital Ecológica” e hoje a “Capital Tecnológica” (p. 125).

As ações que permitem analisar as possibilidades e contradições do desenvolvimento turístico interligado ao desenvolvimento urbano da área central de Curitiba são apresentadas no próximo capítulo, a partir da análise das políticas urbanas e das políticas setoriais do turismo, que delineiam e orientam uma análise pormenorizada dos planejamentos urbano e turístico, através de planos e projetos.

3 O PLANEJAMENTO TURÍSTICO COMO INTEGRANTE DO PLANEJAMENTO URBANO: UMA ANÁLISE DO CENTRO DE CURITIBA

Planejar o espaço urbano pressupõe não apenas se pensar cada elemento deste espaço, como também a articulação destes entre si e com o contexto em que estão inseridos.

Este capítulo analisa os planos e projetos elaborados para a área central de Curitiba, identificando como os diferentes elementos do espaço turístico urbano são trabalhados no planejamento turístico e no planejamento urbano. Para cumprimento desta tarefa, efetuou-se uma reflexão sobre a inter-relação do planejamento setorial e do planejamento integrado.

Nesta análise, o Projeto “Linha Pinhão – Pegadas da Memória” (FENIANOS; MENDONÇA, 1996) representa o planejamento setorial do turismo. Este projeto cultural e histórico permite conhecer o centro de Curitiba a partir de um roteiro para ser percorrido a pé. Sua inauguração foi em 1993 durante as festividades do tricentenário da fundação de Curitiba.

De outro modo, o Plano Diretor Municipal representa o planejamento integrado. A análise focaliza o zoneamento do uso e ocupação do solo (Lei n. 9800/2000 e decretos complementares), que determinam os parâmetros a serem obedecidos tais como gabarito de altura, solo criado, entre outros. Estes estudos estão circunscritos aos limites do centro de Curitiba.

3.1 A ESTRUTURA DE PLANEJAMENTO NO BRASIL HOJE: BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO
Todo e qualquer tipo de planejamento é um instrumento de poder. O poder é algo indissociável do conceito de planejamento se consideramos que este é constituído de um constante processo de tomada de decisão, que podem afetar, em maior ou menor grau, um conjunto de pessoas. A política é parte integrante e delineia o planejamento. A partir de diretrizes políticas são elaborados planos, programas e projetos. Apresenta-se na seqüência uma síntese sobre as políticas direcionadas ao desenvolvimento urbano de um lado, e ao turismo de outro, interpretando possíveis convergências e divergências.

3.1.1 O Planejamento do Desenvolvimento Urbano
O planejamento do desenvolvimento urbano no Brasil está previsto na Constituição Federal de 1988, no capítulo que dispõe sobre a Política Urbana, em seus artigos 182 e 183, e transcreve que compete aos municípios executar a política de desenvolvimento urbano, através de diretrizes gerais fixadas em lei municipal, visando ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes.

A Legislação Urbana é constituída basicamente dos seguintes instrumentos legais: Lei do Plano Diretor; Lei de Parcelamento do Solo para Fins Urbanos; Lei do Perímetro Urbano, e da Expansão Urbana; Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano (Zoneamento); Lei do Sistema Viário; Código de Obras; e do Código de Posturas.

Vale refletir sobre a ação do Governo Federal em que cria o Ministério das Cidades, procurando superar uma forma de trabalho e visão segregaria de aspectos sócio-funcionais inerentes as cidades, ou seja, o que anteriormente trabalhava-se como problemas fragmentados e isolados – saneamento, habitação, transportes, outros –, passou a ser encarado sistematicamente.

Outro aspecto de sua criação está na busca da definição de uma política nacional de desenvolvimento urbano em consonância com os demais entes federativos (município e estado), demais poderes do Estado (legislativo e judiciário), além da participação da sociedade visando à coordenação e a integração dos investimentos e ações nas cidades do Brasil dirigidos à diminuição da desigualdade social e a sustentabilidade ambiental (BRASIL, 2005a). Não se pode deixar de mencionar que as taxas de urbanização no Brasil atingem aproximadamente 80%.

Nesse contexto, são várias as atribuições dos municípios, dentre as quais, destacam-se: Ações de planejamento urbano, políticas fundiárias e imobiliárias, (que incluem zoneamento, regularização da posse ou propriedade, código de obras) requalificação de áreas centrais, entre outras.

Para nortear as políticas setorial e nacional para o desenvolvimento urbano, foi organizado pelo Ministério em 2003, a 1ª Conferência Nacional das Cidades, sediado em Brasília. Os trabalhos foram desenvolvidos a partir das temáticas “Cidade para Todos” e “Construindo uma política democrática e integrada para as cidades” (BRASIL, 2005a). No total 3.457 municípios participaram de conferências preparatórias à Nacional, sendo que 1.430 realizaram conferências municipais e 2.027 municípios participaram através de 150 encontros regionais, além das 26 conferências estaduais e uma do Distrito Federal (BRASIL, 2005a).

São resultados da conferência, novas propostas para o desenvolvimento urbano e a composição e eleição do Conselho das Cidades. O Conselho das Cidades é constituído por 71 titulares – 41 representantes de segmentos da sociedade civil e 30 dos poderes públicos federal, estadual e municipal – além de 71 suplentes, com mandato de dois anos (BRASIL, 2005a). É de se destacar que iniciativa semelhante foi aplicada pelo Governo Federal na criação do Conselho Nacional de Turismo em 2003.

Não poder-se-ia prosseguir na análise sem mencionar o Estatuto da Cidade (Aprovado pelo Congresso Nacional após dez anos de tramitação, o Estatuto da Cidade, regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal de 1988 que conformam o capítulo relativo à Política Urbana (IPPUC, 2004) e que vigora desde 2001 e estabelece normas de ordem pública e social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança, do bem estar da população e do equilíbrio ambiental. Cria ainda, mecanismos que possibilitam aos municípios uma melhor definição de suas políticas urbanas.

O Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba aponta que a criação do Estatuto da Cidade atribui maior responsabilidade de gestão urbana aos municípios.

Um aspecto singular é que mesmo aqueles municípios que já possuem planos diretores, terão um prazo de cinco anos, contados a partir da data em vigor da lei, para providenciarem as adequações necessárias.

Em nível estadual, o estado do Paraná conta com “Serviço Social Autônomo PARANACIDADE”, empresa de direito privado, sem fins lucrativos, de interesse coletivo, com finalidade de prestar assistência institucional e técnica aos municípios e de captar e aplicar recursos financeiros no processo de desenvolvimento urbano e regional do Estado do Paraná, tendo sede em Curitiba e 5 Escritórios Regionais (PARANACIDADE, 2005).

Na organização e gestão urbana, em nível municipal, Curitiba conta com o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano (IPPUC). Desde sua criação, em 1965, vem acompanhando o desenvolvimento da cidade e a partir do ano de 1970, esse trabalho intensificou-se com a parceria firmada com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – órgão do governo federal responsável pelas principais estatísticas oficiais brasileiras (IPPUC, 2004).

A acumulação de dados demográficos e a sua correta interpretação representam uma importante ferramenta para o planejamento e a gestão da cidade, permitindo a avaliação do comportamento de inúmeras variáveis fundamentais para o monitoramento da cidade. No entanto, constitui-se em desafio para inúmeros municípios brasileiros que apresentam dificuldades básicas concernentes a organização e gestão das prefeituras.

3.1.2 O Planejamento Setorial do Turismo
Pode-se afirmar que uma política de turismo é o instrumento maior que antecede planos, programas e projetos. Ela pode ser considerada

[...] a espinha dorsal do ‘formular’ (planejamento), do ‘pensar’ (plano), do ‘fazer’ (projetos e programas), do ‘executar’ (preservação, conservação, utilização e ressignificação dos patrimônios natural e cultural e sua sustentabilidade), do ‘reprogramar’ (estratégia) e do ‘fomentar’ (investimentos e vendas) o desenvolvimento turístico de um país ou de uma região e seus produtos finais (BENI, 2001, p. 77).

A política de turismo é o instrumento que traça as diretrizes do desenvolvimento do turismo, podendo estimular ou restringir ações voltadas à prática da atividade turística. Não se trata de um plano do turismo, mas do ponto de referência para futuras decisões. As políticas precedem o planejamento e são, geralmente, estabelecidas pelo governo. Segundo Lickorish e Jenkins (2000, p. 224) “uma política é uma consideração sensata de alternativas”.

Cruz (2001) destaca ainda, que uma política pública de turismo deve ser entendida como um conjunto de intenções, diretrizes e estratégias estabelecidas no âmbito do poder público, em virtude do objetivo geral de alcançar e/ou dar continuidade ao pleno desenvolvimento da atividade turística num dado território. Uma política de turismo precisa ser coerente e flexível diante das mudanças circunstanciais do mercado e ainda, passível de reorganizar prioridades quando necessário.

Na história do turismo no Brasil, apenas três políticas nacionais de turismo foram, até então, instituídas. A primeira delas em 1966, que define e institui pela primeira vez, uma Política Nacional de Turismo e cria o Conselho Nacional de Turismo (CNTur) e a Empresa Brasileira de Turismo (Embratur), ainda no Governo de Castello Branco. Esse período estende-se até 1991, com a revogação da Lei, que reestrutura a Embratur, passando de Empresa Pública para Instituto Brasileiro de Turismo, com a finalidade de formular, coordenar e executar a política nacional de turismo, como já acontecia na prática (CRUZ, 2001).

A segunda Política Nacional de Turismo, instituída em 1996 no Governo de Fernando Henrique Cardoso (FHC), foi orientada pelos seguintes objetivos (CRUZ, 2001, p. 63): a) ordenação das ações do setor público orientando o esforço do Estado e a utilização dos recursos públicos para o bem estar social; b) definição de parâmetros para o planejamento e a execução das ações dos governos estaduais e municipais; e c) orientação referencial do setor privado.

As ações da Política Nacional de Turismo do período 1996-1999 foram orientadas por quatro macroestratégias (CRUZ, 2001, p. 63):
a) ordenamento, desenvolvimento e promoção da atividade pela articulação entre governo e iniciativa privada;
b) qualificação profissional dos recursos humanos envolvidos no setor;
c) descentralização da gestão turística por intermédio do fortalecimento de órgãos delegados estaduais, municipalização (A municipalização levou a implantação do Programa Nacional de Municipalização do Turismo (PNMT), também lançado em 1996, e que fundamentou a política instituída pelo governo FHC. “O PNMT é um processo de conscientização, sensibilização, estímulo e capacitação dos vários agentes de desenvolvimento que compõem a estrutura do município, para que despertem e reconheçam a importância e a dimensão do turismo como gerador de emprego e renda, conciliando o crescimento econômico com a preservação ambiental, histórica e de herança cultural, tendo como fim a participação e a gestão da comunidade nas decisões dos seus próprios recursos” (EMBRATUR, 1997, p. 12), do turismo e terceirização de atividades para o setor privado; e
d) implantação de infra-estrutura básica e turística adequada às potencialidades regionais.

A política instituída pelo Governo FHC se estendeu até 2002, ao final de seu segundo mandato. Com a eleição de Luiz Inácio da Silva para Presidente da República, a história do turismo nacional foi marcada pela criação de um Ministério exclusivo do Turismo – conseqüência de uma antiga reivindicação do setor – composto pela seguinte estrutura política-administrativa: Secretaria de Políticas de Turismo, Secretaria de Programas de Desenvolvimento do Turismo, Embratur e Conselho Nacional de Turismo (BRASIL, 2003).

A visão apresentada no Plano Nacional de Turismo 2003-2007, pelo Ministério, enfoca que:

O Turismo no Brasil contemplará as diversidades regionais, configurando-se pela geração de produtos marcados pela brasilidade, proporcionando a expansão do mercado interno e a inserção efetiva do país no cenário turístico mundial. A geração do emprego, ocupação e renda, a redução das desigualdades sociais e regionais e o equilíbrio do balanço de pagamentos sinalizam o horizonte a ser alcançado pelas ações estratégicas indicadas (BRASIL, 2003, p. 14).

Os objetivos do Ministério do Turismo (BRASIL, 2003) com este Plano são os de desenvolver o produto turístico brasileiro com qualidade, contemplando as diversidades regionais, culturais e naturais; e de estimular e facilitar o consumo do produto turístico brasileiro nos mercados nacional e internacional.

Seus objetivos específicos são: dar qualidade ao produto turístico; diversificar a oferta turística; estruturar os destinos turísticos; ampliar e qualificar o mercado de trabalho; aumentar a inserção competitiva do produto turístico no mercado internacional; ampliar o consumo do produto turístico no mercado nacional; além de aumentar a taxa de permanência e gasto médio do turista.

O Plano Nacional de Turismo 2003-2007 apresenta desdobramentos temáticos que se apresentam em sete macroprogramas. Dentre estes cabe ressaltar o Programa de Regionalização do Turismo, que tem como meta a formatação de 81 produtos potenciais a serem comercializados internacionalmente. Calcula-se três destinos por estado e Distrito Federal, proporcionando condições para o aumento do fluxo de visitantes e melhorando as condições dos municípios e regiões.

No estado do Paraná foram identificadas nove regiões turísticas: o Litoral, os Campos Gerais, o Noroeste (Maringá), o Norte (Londrina), Curitiba e Região Metropolitana, o Centro-Sul (Irati), o Centro (Guarapuava), Oeste e Municípios Lindeiros (Cascavel) e o Sudoeste (Pato Branco). Três destas regiões estarão estruturando, através do Programa de Regionalização do Turismo, os “Roteiros do Brasil”.

O desenvolvimento do turismo na cidade de Curitiba está fundamentado nas diretrizes que delineiam a Política Estadual de Turismo 2003-2007, lançada oficialmente em 12 de junho de 2003 pela Secretaria de Estado do Turismo (SETU) durante a abertura do V Encontro Estadual de Secretários e Monitores Municipais de Turismo em Foz do Iguaçu.

Trata-se de um documento que abrange um conjunto de estratégias, objetivos, metas e ações com a finalidade de promover e incrementar o Turismo como fonte de renda, geração de emprego e desenvolvimento sócio-econômico para o Estado, tendo em vista a promoção de inclusão social (PARANÁ, 2003).

A estruturação dessa Política contou com a contribuição dos representantes do poder público, da iniciativa privada, das instituições de ensino e da sociedade civil organizada que atuam na atividade turística, e apresenta algumas áreas estratégicas, para atingir objetivos e alcançar metas:
a) Gestão Pública e Articulação Institucional para o Turismo;
b) Envolvimento da Sociedade com o Turismo;
c) Municipalização e Regionalização do Turismo;
d) Qualidade do Produto Turístico;
e) Estatísticas do Turismo;
f) Proteção ao Patrimônio Natural/Histórico/Cultural;
g) Financiamentos e Investimentos; e
h) Promoção e Divulgação do Produto Turístico Paranaense.

Em nível estadual destaca-se ainda a Ecoparaná3. O Serviço Social Autônomo Ecoparaná foi criado para ajudar a desenvolver o amplo potencial turístico do Paraná tendo em vista a consolidação de uma atividade econômica consistente, sob o enfoque da sustentabilidade (ECOPARANÁ, 2005).

O principal objetivo da empresa reside no planejamento, promoção e gerenciamento de ações relacionadas ao turismo sustentável, com ênfase ao turismo em áreas naturais, em parceria com a iniciativa privada e instituições públicas.

Desde 1998 a Ecoparaná possui um contrato de gestão com o Governo do Paraná, realizando projetos em diversas regiões do Estado. Este trabalho objetiva transformar informações em ações e potenciais existentes em produtos turísticos, oferecendo oportunidades de negócios e atraindo novos investimentos para o setor
3 A Ecoparaná é uma empresa privada que tem como missão planejar, promover e gerenciar projetos e ações relacionadas ao turismo no estado, com ênfase no turismo em áreas naturais, como instrumento para proteção do meio ambiente e desenvolvimento econômico do estado turístico. A área de maior atuação da Ecoparaná é o litoral paranaense (ECOPARANÁ, 2005).

Como o produto turístico, de modo geral, é local, “há em decorrência uma forte responsabilidade da administração municipal no desenvolvimento do turismo, e o planejamento é somente uma de suas funções” (DIAS, 2003, p. 149).

O Conselho Municipal de Turismo é um órgão necessário para colaborar no processo de gestão turística. Para sua efetividade é importante contar com representantes dos setores da Prefeitura mais envolvidos com a Política de Turismo, como os de urbanismo e planejamento, obras e serviços públicos, meio ambiente, cultura e transportes (DIAS, 2003).

Em nível estadual a organização turística conta ainda com a Paraná Turismo, criada através da Lei nº 11066 de 01/02/1995, inicialmente vinculada à Secretaria de Estado de Esporte e Turismo, com sede e foro na Comarca de Foz do Iguaçu, uma sub-sede na cidade de Curitiba e escritórios regionais em Londrina e Matinhos. É uma entidade autárquica estadual, dotada de personalidade jurídica de direito público, com patrimônio e receita próprios e autonomia administrativa e financeira. Suas atribuições, estrutura e funcionamento foram regulamentadas pelo Decreto 989 de 05/07/1995, e atualizadas pelo Decreto 578 de 14/02/2003 (PARANÁ, 2005).

Pelo Decreto nº 3403 de 11 de janeiro de 2001, a Paraná Turismo ficou vinculada à Secretaria de Estado da Indústria, do Comércio e do Turismo - SEIT. Atualmente a Paraná Turismo encontra-se vinculada à Secretaria de Estado do Turismo - SETU criada pela lei nº 13.986 de 30/12/2002 (PARANÁ, 2005).

Observando a estrutura organizacional do turismo na cidade de Curitiba, identificam-se os seguintes órgãos4 públicos gestores da atividade: a Secretaria Municipal de Turismo e ainda, a Companhia de Desenvolvimento de Curitiba (CIC) - Diretoria de Turismo.

4 Órgãos de Turismo são unidades físicas e sociais concebidas para atingir objetivos específicos. São organismos responsáveis por implementar as políticas de turismo que orientam as ações dos diferentes segmentos do setor. Têm funcionamento técnico/administrativo e acompanha a evolução do turismo em seus aspectos social, econômico, político, cultural e ambiental, que garantem a sustentabilidade da atividade. Juntas formam o sistema de turismo, responsável pelo desenvolvimento do setor de forma sustentável e integrada (www.viaje.curitiba.pr.gov.br/ órgãosoficiais/index/html).

A Secretaria Municipal de Turismo de Curitiba tem como missão “promover o turismo sustentável em Curitiba, contribuindo para o desenvolvimento socioeconômico da população” (CURITIBA, 2005b).

O cenário que hoje delineia as ações da Secretaria Municipal de Curitiba é o da Regionalização do Turismo, seguindo o programa do Ministério do Turismo, a partir da criação de roteiros específicos e integrados que contemplem as potencialidades regionais, e que se configurem como produtos acabados para comercialização.

Um outro órgão gestor do turismo em nível municipal é a Companhia de Desenvolvimento Urbano de Curitiba, que por intermédio da Diretoria de Turismo, atua na promoção do turismo na cidade, e tem como objetivos: planejamento do setor a curto, médio e longo prazo dentro de uma visão sistêmica de sustentabilidade; implementação de um novo patamar na gestão pública do turismo como vetor de desenvolvimento econômico; consolidação do conceito diferenciado de Curitiba como “Destino Turístico de Qualidade”; e a consolidação de um eixo turístico ambiental, “Linhão do Turismo”, atrativo para os curitibanos e turistas, visando a conservação do meio ambiente e o desenvolvimento de potencialidades turísticas, econômicas e culturais de sua área de abrangência (CIC, 2005).

Pode-se perceber a partir do exposto acima que a política de desenvolvimento urbano e a política setorial do turismo apresentam descentralização de gestão, ou seja, as diretrizes traçadas em nível federal, traduzem-se em ações que devem ser implementadas nos níveis estaduais e mais especificamente na esfera municipal.

Isso porque, as cidades em si, apresentam características, problemas e especificidades singulares. Isto posto, verifica-se que tal proposição é mais que razoável frente as políticas implementadas pelo governo federal, que são abrangentes e genéricas, pois apresentam caminhos, que permitem ajustes as particularidades de cada município.

A descentralização mostra-se como uma realidade cada vez mais forte e presente nas políticas públicas, tanto para as políticas urbanas como para as políticas setoriais do turismo. O município é responsável pelo cumprimento e monitoramento das leis, organização e gestão urbana, assim como, pelo desenvolvimento do turismo, quando assim o desejar.

Essa descentralização da gestão turística vem sendo difundida desde a gestão de Fernando Henrique Cardoso, com a proposta do Programa Nacional de Municipalização do Turismo, e reafirmada no governo Lula, com o Programa de Regionalização do Turismo.

O que diferencia o Programa de Municipalização do de Regionalização é a área de abrangência, visto que o primeiro refere-se especificamente ao município, e o segundo contempla uma região com produtos de destacado potencial turístico, porém ambos fundamentados pela descentralização da gestão.

3.2 O PLANEJAMENTO URBANO E TURISTICO: UMA ANÁLISE DE PLANOS E PROJETOS
A partir deste momento, a análise centra-se no planejamento em Curitiba.

Primeiramente, a reflexão volta-se para o planejamento urbano integrado, através do estudo da Lei de Uso e Ocupação do Solo Urbano. Na seqüência a análise gira em torno do planejamento setorial do turismo, através da análise do Projeto “Linha Pinhão”.

A referência utilizada é a área central da cidade.

3.2.1 O Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo
A primeira tentativa de controle do uso do solo urbano em Curitiba aconteceu em 1853, na iminência de tornar-se a capital da nova província. A população multiplicava-se rapidamente e mudanças no cenário urbano levaram as autoridades locais, juntamente com a participação de profissionais da área de engenharia, autoridades judiciais e médicos higienistas, a elaboração do primeiro Código de Posturas de Curitiba, em 1895, com a finalidade de encontrar meios para “manter a ordem” da cidade (MENEZES, 2001, p. 59).

Contudo, a história formal do planejamento urbano de Curitiba tem início efetivamente em 1943, com a elaboração de um plano urbanístico encomendado à empresa Coimbra & Cia, executado pelo arquiteto francês Alfred Agache, fundador da Sociedade Francesa de Urbanismo. O Plano Agache, considerado um dos primeiros planos do Brasil, incluí medidas de saneamento, definição de áreas para habitação, serviços e indústrias e reestruturação viária. O Plano apontava diretrizes e normas técnicas para ordenar o crescimento físico, urbano e espacial da cidade (IPPUC, 2003c).

Oliveira (2000, p. 74) aponta que se pensava “a cidade como um conjunto arquitetônico que deveria atender a certo número de funções essenciais como trabalho, habitação e circulação”. A cidade passaria por uma setorização de acordo com as funções citadas, sem deixar de lado a necessidade de interligar os setores por vias expressas.

Dessa forma, Agache designou centros funcionais setorizados – militar (base aérea do bairro Bacacheri e outras instalações do exército), de abastecimento (Mercado Municipal, construído na década de 1950), de educação (uma cidade universitária – o Centro Politécnico), industrial (bairros Capanema e Rebouças), administrativo (o Centro Cívico), além das zonas residenciais (OLIVEIRA, 2000).

No entanto, as obras de Agache só foram implantadas parcialmente. No início da década de 1960, o Plano Agache, já defasado, precisou ser adaptado. Logo, por intermédio da Lei nº 1908/60, aprova-se o Plano Piloto de Zoneamento de Uso, instituindo as Unidades de Vizinhança - 47 urbanas e 5 rurais. Cada uma destas unidades deveria ser equipada com sistema viário estruturado, escola básica, área verde para recreação pública, além de legislação para regular o uso e a ocupação do solo. Este mesmo Plano de Zoneamento estabelece uma nova divisão da cidade em zonas residenciais, comerciais, industriais e rurais (IPPUC, 2003c).

Segundo Menezes (2001), a total execução do Plano Agache não se viabilizou ao longo do tempo, por fatores de ordem jurídica, política e econômica que dificultaram o detalhamento de todas as diretrizes propostas.

Contudo, a fase mais conhecida do planejamento urbano de Curitiba começou com a elaboração do Plano Diretor de Curitiba de 1965. Partiu de um plano preliminar de urbanismo elaborado pela empresa Serete Engenharia S.A. e contou com a institucionalização do planejamento urbano através da criação do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (IPPUC), em 1966 (OLIVEIRA, 2000).

A aprovação do Plano Diretor de Urbanismo, através da Lei 2.828 de 31 de julho de 1966, marca o início da expansão do centro de Curitiba ao longo dos Eixos Estruturais que cortam a cidade de norte a sul e de leste a oeste, e o início de um dinâmico processo de planejamento. Para que Curitiba pudesse crescer na direção desejada, o Plano Diretor integrou as quatro funções urbanas apregoadas pelo movimento modernista: habitar, circular, trabalhar e recrear, como ensinou Le Corbusier (apud SANTOS, 1978).

Na década de 1970, o centro tradicional da cidade foi estruturado com áreas exclusivas para pedestres, com destaque para Rua XV de Novembro (IPPUC, 2004).

Tal medida fazia parte da diretriz do Plano Serete de pedestrianizar a região central da cidade (MENEZES, 2001). A transformação desta rua, “logradouro” segundo a classificação de Lynch (1997), em Calçadão atribui-lhe uma função de “roteiro”, como classifica Boullón (2002).

No ano de 1971, o Decreto 1.160 delimitou o Setor Histórico de Curitiba, que localiza-se na zona central da cidade. Cabe ressaltar a utilização do elemento “setor” de Boullón (2002) pelo Planejamento Urbano.

Para dar forma e alimentar o processo de transformação pretendida pela cidade, foi criada a Fundação Cultural de Curitiba (FCC), que passou a ser responsável pela política cultural da cidade (MENEZES, 2001). Dessa forma, o Ippuc ficava responsável pelo planejamento físico da cidade, e a FCC pelo projeto de ocupação, dando vida à obra instituída.

Mas foi a partir do ano de 1972, com a Lei 4.199, que o zoneamento e a legislação que orientam a ordenação urbana da cidade, deixam de ser simples instrumentos disciplinadores das construções e urbanizações e passam a configurar-se como instrumento catalisador e promotor de desenvolvimento (IPPUC, 2004).

Dando continuidade ao Plano Serete e buscando adequar o controle do uso do solo urbano à nova realidade populacional e social da cidade, foi criada a Lei 5.234/1975 – Zoneamento e Uso do Solo – modificando a lei de 1972 (MENEZES, 2001).

Curitiba chega à década de 1980 com uma população de pouco mais de um milhão de habitantes. Nesta mesma década a cidade produziu um amplo diagnóstico, utilizado como ferramenta de planejamento - o PMDU - Plano Municipal de Desenvolvimento Urbano, que propõe diretrizes para um modelo de desenvolvimento, a partir da criação de centros secundários. Estes centros secundários serviram de referência para a implantação das Administrações Regionais em 1986 (IPPUC, 2003c).

Também em 1980, o então Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal repassa, formalmente, ao município a responsabilidade sobre as áreas verdes.

Através da criação de legislações específicas são estimuladas, com incentivos e limites para o fracionamento do solo, a preservação e a formação de áreas verdes.

Em 1986, o Decreto 142, estabeleceu a divisão de Curitiba em 8 Administrações Regionais. Em 1988 elas foram reduzidas para 6 Administrações Regionais. A partir desta divisão, o planejamento passa a ser executado com o objetivo de estruturar estes novos espaços, buscando identificar as características e similaridades de cada uma destas regiões (IPPUC, 2003c).

No ano de 1990, a cidade se transforma na Capital Ecológica do Brasil. São criados seis novos parques, o Jardim Botânico e oito bosques, que somados totalizam mais de oito milhões de metros quadrados de áreas verdes públicas (IPPUC, 2003c).

A ação de planejamento metropolitano, preconizada desde o Plano Diretor de Curitiba, volta a fazer parte do programa estratégico de desenvolvimento de Curitiba a partir de 1994, mantendo-se até hoje (IPPUC, 2003c).

Outros instrumentos legais podem se incorporar ao conjunto da Legislação Urbana, como a Lei do Meio Ambiente, a Lei Sanitária, e leis necessárias para a implementação dos novos instrumentos exigidos pelo Estatuto da Cidade.

No ano de 1982, o IPPUC propôs a criação de um instrumento destinado à preservação do patrimônio histórico, cultural e arquitetônico da cidade, que estabeleceu-se por meio da Lei 6.337 – a Lei do Solo Criado (Este instrumento foi regulamentado pela Lei Federal nº 10.257 (Estatuto da Cidade) em 2001, demonstrando a posição de vanguarda de Curitiba com relação a questão do Planejamento Urbano. – que propõe a transferência de potencial construído em edificações de valor histórico, cultural ou arquitetônico, para outra área da cidade, desde que o patrimônio seja preservado.

A Lei foi usada para restauração de três edificações históricas, consideradas “marcos” no centro da cidade segundo a classificação de Lynch (1997) e Boullón (2002): a Universidade Federal do Paraná, a Catedral Metropolitana de Curitiba e a Sociedade Garibaldi, localizadas no centro da cidade, e interpretados neste estudo como marcos urbanos.

O crescimento acelerado da cidade, o aumento da população, e as novas diretrizes do Estatuto da Cidade, levam Curitiba a rever e discutir uma nova lei de Zoneamento de Uso e Ocupação do Solo (Lei 9.800 do ano de 2000 – vide anexo 2). Entre os decretos complementares, pode-se destacar o que trata especificamente da Zona Central (ZC) de Curitiba, que compreende o centro tradicional, e é caracterizado por grande concentração de atividades e funções urbanas de caráter setorial, sendo permitido o uso habitacional, comercial e de prestação de serviços, excetuando-se os hipermercados.

O coeficiente de construção nesta zona é igual a cinco, o que vale dizer que se pode construir uma metragem quadrada de até cinco vezes a do lote. Isto equivale dizer que busca-se um adensamento desta zona pela verticalização. As edificações verticalizadas podem ter uma taxa de ocupação de até 100% tanto no térreo como no 1º pavimento, já na torre esta ocupação não pode ultrapassar os 66% (IPPUC, 2004).

O zoneamento do uso e ocupação do solo urbano é utilizado como um mecanismo de planejamento urbano em direção à estrutura urbana concedida pelas diretrizes do Plano Diretor, caracterizando zonas com funções específicas e estabelecendo os parâmetros de ocupação nas mesmas, e aparece como orientador de investimentos e disciplina as atividades e usos por parte da iniciativa privada, adequando-os aos objetivos e metas do Plano Diretor.

Para se estimular o uso residencial, ampliar espaços de passeio para pedestres e considerando a pouca oferta de vagas em estacionamento no seu entorno, foram instituídos, através do decreto 184/00, incentivos para galerias comerciais e edifícios de habitação coletiva e condições para implantação de estacionamentos privativos ou coletivos (SANTORO, 2002, p. 79).

O planejamento global exige esforços que vão além da adequação física e ambiental do espaço urbano. Exige ainda, a projeção de componentes de cunho estratégico, que contemplem a qualidade de vida a partir da concepção de espaços de animação, programas de cultura e lazer coletivo que vem complementar o Plano Diretor da cidade, dando mais significado e visibilidade nas suas propostas.

Essas ações estimulam a compreensão e a visitação turística da cidade, como é o caso da conservação do patrimônio edificado no Setor Histórico, em torno do Largo da Ordem, onde foram projetados feiras e espaços culturais que junto com o valor histórico de suas edificações, estimulam os interesses de visitação turística.

Segundo o IPPUC (2004), “são estabelecidos critérios para se atingir uma linguagem de animação, de cultura e de lazer na cidade, de modo que todo cidadão se deleite com o Plano Diretor e participe mais de sua crescente consolidação” (p. 183).

Contudo, a fusão do planejamento urbano de Curitiba com a prática do turismo se dá, definitivamente, por volta do ano de 1990 (IPPUC, 2004). Entre os marcos iniciais dessa integração, pode-se destacar o projeto Linhão do Turismo, que reafirma valores culturais para o visitante e o cidadão local. O projeto inclui em seu itinerário os Patrimônios do Estado e da União e abriga ainda em seu circuito o projeto Viver Curitiba, o qual mobiliza segmentos para os temas da preservação ambiental, da memória e da cultura (IPPUC, 2004).

Também são ações que integram a cultura, o turismo e o lazer, o cadastramento do patrimônio histórico junto ao IPPUC, tendo mais de mil unidades, sendo 143 tombadas pelo estado (IPPUC, 2004).

A seguir o estudo concentra-se na análise do planejamento setorial do turismo a partir dos elementos identificados no projeto Linha Pinhão, e de que forma esses elementos são trabalhados no processo de planejamento urbano.

3.2.2 A “Linha Pinhão – Pegadas da Memória”
A “Linha Pinhão” caracteriza-se por caminhos turísticos, culturais e históricos, através das chamadas “Pegadas da Memória” impressas no chão da cidade, assinalando pontos no centro de Curitiba (Figura 02). Trata-se de um “roteiro” turístico segundo a concepção de Boullón (2002). Os elementos do espaço turístico urbano que a compõe são apresentados aqui também através das classificações apontadas pelo mesmo autor.

A “Linha Pinhão”, inaugurada em 1993, tinha por objetivo apresentar alguns aspectos da paisagem urbana que testemunharam a história da cidade. Foi idealizada através de seis diferentes caminhos para serem realizados a pé, partindo de três elementos, dois “logradouros” e um “marco” na classificação de Boullón (2002): a Praça João Cândido, a Praça Osório e a Universidade Federal do Paraná. A encruzilhada destes caminhos, “ponto nodal” na classificação de Lynch (1997), era representada pela “Pinha-dos-Ventos”, que foi estabelecida no encontro das ruas Barão do Rio Branco e XV de Novembro.

Com efeito, é razoável aceitar que a Linha Pinhão está sub-aproveitada no Centro de Curitiba, resultando em prejuízo para o turismo receptivo e sobretudo para a comunidade. Portanto, sua análise implica também, numa tentativa de resgatar essa opção de lazer e educação associada à história e cultura de Curitiba. Os “logradouros”, “setores”, “marcos” e “roteiros” que compõe a “Linha Pinhão” aparecem classificados no Quadro 04 e exemplos são ilustrados no Quadro 05 .
Os elementos que compõem a “Linha Pinhão” são identificados por placas instaladas quando da criação desse roteiro histórico, em comemoração ao tricentenário de Curitiba, conforme demonstra a foto 13.

FOTO 13 – EXEMPLO DE PLACA UTILIZADA PARA IDENTIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS COMPONENTES DA LINHA PINHÃO



FONTE: SIVIERO, A. P., 2005. Acervo Pessoal.

Cabe destacar que são poucos os elementos da Linha Pinhão que ainda encontram-se identificados por meio da placa, ou de qualquer outro instrumento de sinalização, que permita identificá-lo como parte do roteiro. Por conseguinte, é de se supor que o uso turístico está comprometido, uma vez que não há comunicação visual dos elementos.

Figura 02 – LINHA PINHÃO: PEGADAS DA MEMÓRIA

FONTE: FENIANOS, E. E.; MENDONÇA, M. N., 1996.

Quadro 05 – CLASSIFICAÇÃO DOS ELEMENTOS DO ESPAÇO TURÍSTICO DO CENTRO DE CURITIBA APRESENTADOS NA “LINHA PINHÃO”
Ruas - R. Jaime Reis / R. Doutor Claudino dos Santos / R. José Bonifácio / R. Barão do Rio Branco / Avenida Luiz Xavier

Cruzamentos - Pinha dos Ventos / Senadinho / Boca Maldita

Praças - Pça João Cândido / Pça Garibaldi / Pça Tiradentes / Pça José Borges de Macedo / Pça Generoso Marques / Pça Santos Andrade / Pça Osório

LOGRADOUROS
Galerias - Júlio Moreira / Lustoza / Schaffer e Cine Groff / do Plano Agache
Edificações - Sociedade Beneficente Protetora dos Operários / Sociedade Garibaldi / Fundação Cultural de Curitib / Casa Romário Martins / Casa Vermelha / Grande Hotel Moderno / Café Alvorada / Livraria Ghignone / Confeitaria das Famílias / Banestado / Louvre / Cine Ritz / Foto Brasil / Bar Mignon / Braz Hotel / Edifício Garcez / Correio Velho / UFPR / Bar Triângulo / Palácio Avenida

Igrejas - Arcadas de São Francisco / do Rosário / Presbiteriana / Independente / da Ordem / Catedral Basílica Menor de Nossa Senhora da Luz

Museus - de Arte Sacra / na Rua / de Arte do Paraná (Antigo Museu Paranaense) / Mirante / Belvedere

Cartaz/Painel - Museu na Rua

MARCOS - Artefatos Urbanos / Relógio das Flores / Bondinho
SETORES
Setor Histórico - Largo da Ordem
Roteiro opcional 1: Ruas Mateus Leme, São Francisco e Treze de Maio
Roteiro opcional 2: Ruas José Bonifácio, Saldanha Marinho e Doutor Muricy
Roteiro opcional 3: Ruas Barão do Rio Branco e XV de Novembro (ao sul)
Roteiro opcional 4: Ruas Barão do Rio Branco e XV de Novembro (ao norte) – Rua Riachuelo
Roteiro opcional 5: Ruas XV de Novembro, Doutor Muricy e Cândido Lopes
Roteiro opcional 6: Rua XV de Novembro, Travessa Oliveira Bello, Rua Emiliano Pernetta e Rua Desembargador Westphalen

Fonte: FENIANOS e MENDONÇA (1996) Org.: SIVIERO, A. P.

Quadro 06 – EXEMPLOS DE ELEMENTOS DO ESPAÇO TURÍSTICO DO CENTRO DE CURITIBA APRESENTADOS NA “LINHA PINHÃO”

Logradouro / Foto 14 - Praça Generoso Marques


Marco / Foto 15 - Museu na Rua


Setor / Foto 16 - Largo da Ordem


Roteiro / Foto 17 - Roteiro Opcional 2 (Casa Vermelha)

Fonte: www.curitiba.pr.gov.br; www.cic-curitiba.com.br / Org.: SIVIERO, A. P.

Uma caracterização dos elementos do espaço turístico utilizados na “Linha Pinhão” é feita a brando que alguns destes elementos são bens tombados e, porta to, já aparecem detalhados no Capítulo II. Para esta caracterização utilizaram-se informações bibliográficas diversas, tais como: Fenianos e Lyra (1994), Iphan (2005), Ippuc, além de documentos eletrônicos de órgãos diversos (IPHAN, IPPUC etc.).

Os “logradouros”, segundo Boullón (2002, p. 196), são espaços abertos ou cobertos de uso público, em que o turista pode entrar e que pode percorrer livremente.

Na proposta da “Linha Pinhão” foram identificados quatro categorias destes elementos: ruas, cruzamentos, praças e galerias.

Na categoria “rua” o destaque é para:

Rua Jaime Reis: Esta rua era denominada Avenida Cruzeiro. O nome atual é de 1918, em memória ao médico, jornalista, escritor e deputado estadual Drummond dos Reis, falecido em 1912. As antigas residências das primeiras décadas do século XX foram hoje transformadas em bares, restaurantes e espaços culturais.

Rua Doutor Claudino dos Santos: Esta rua de apenas uma quadra liga o Largo da Ordem à Rua do Rosário e à Praça Garibaldi. Já foi denominada Rua Nova de São Francisco e Rua São Francisco de Paula. Tem o nome atual desde 1918 em homenagem ao médico curitibano. Possui casarões ecléticos, de inspiração alemã. Um dos destaques é o Solar do Rosário.

Rua José Bonifácio: O atual nome é de 1886, mas já foi Rua Fechada e Rua do Chafariz. Um dos destaques é o Palacete Hauer, de 1897, em estilo eclético alemão.

Rua Barão do Rio Branco: Nasceu como rua da Liberdade em 1883. Rua do poder, abrigou o Palácio do Congresso, onde funciona a Câmara de Vereadores, e o Palácio do Governo, hoje, é sede do Museu de Imagem e do Som do Paraná. Esta rua foi revitalizada em 1980 e em 1995 deixou de ser rota dos ônibus expresso e foi devolvida para o tráfego de automóveis.

Avenida Luiz Xavier: Uma avenida que compreende uma única quadra, e dá início a Rua XV de Novembro. Surgiu em 1911, como ponto de encontro e a partir da década de 1970, virou calçadão de pedestres. Abrigava um grande número de cinemas e ficou conhecida como Cinelândia.

Na categoria “cruzamento” têm-se:

Pinha dos Ventos: Na esquina das Ruas Barão do Rio Branco e XV de Novembro, os três percursos do roteiro da Linha Pinhão se encontram na chamada “Pinha dos Ventos”.

Senadinho: Café e ponto de encontro na Rua XV de Novembro, entre Avenida
arechal Floriano Peixoto e Rua Monsenhor Celso. Ponto de conversa entre políticos, intelectuais e jornalistas. Está próximo ao antigo endereço do jornal Gazeta do Povo, que tinha uma memorável “pedra”, ou seja, um pedaço de mármore na parede onde as notícias que o jornal divulgaria impressas, no dia seguinte, eram lidas em primeira mão.

Boca Maldita: Tribuna livre criada em 1957 e institucionalizada em 13 de dezembro de 1966. É famosa desde que se atribuiu a ela a responsabilidade pela cassação, nos anos 1970, do governador do Estado Haroldo Leon Peres. Fica no calçadão da Avenida Luiz Xavier, em frente aos cafés.

Na categoria “praça” têm-se:

Praça João Cândido: Já foi Praça do Observatório, ponto de observação da passagem das topas da Revolução Federalista de 1893, iniciada no Rio Grande do Sul, e cujo ápice no Paraná, foi o Cerco da Lapa. Já foi Praça Emílio de Menezes e hoje Praça João Cândido em memória do médico e ex-presidente do Estado, João Cândido Ferreira.
Nas suas redondezas está o Museu Paranaense.

Praça Garibaldi: É assim chamada em homenagem ao unificador da Itália, Giuseppe Garibaldi. Foi revitalizada em 1995 e recebeu a “Fonte da Memória”, junto à cabeça de um cavalo esculpida em bronze pelo escultor Ricardo Tod. É um convite à reflexão de que “o tempo não existe quando a memória do homem permanece” (FENIANOS; MENDONÇA, 1996, p. 07).

Praça Tiradentes: Tem esse nome desde 1889 e foi remodelada em 1994. É o marco zero da cidade, ou seja, a praça ao redor da qual a cidade começou a se desenvolver.

Praça José Borges de Macedo: A praça tem a marca do pelourinho, levantado em 1668, e foi criada por força de lei municipal em 1963. Em 1994, o logradouro ganhou as Arcadas do Pelourinho, que abrigam bancas de revistas e flores e um café, em nome da animação cultural e revitalização do espaço. Em 1996, recebeu ainda, a Fonte Maria Lata D’Água, em homenagem também, à conclusão do Projeto Cores da Cidade (Projeto Cores da Cidade - processo de “revitalização” da área urbana que a partir de 1995
recuperou conjuntos arquitetônicos expressivos no centro histórico de Curitiba.) , que recuperou a arquitetura do casario histórico vizinho à praça.

Praça Generoso Marques: Tem esse nome desde 1928, em homenagem ao Presidente do Estado, Generoso Marques dos Santos, deposto em 1891 pela guarnição militar que apoiou Vicente Machado. A praça concentra um expressivo conjunto arquitetônico, recuperado em 1995 com a execução do Projeto Cores da Cidade.

Praça Santos Andrade: Seu nome homenageia a memória do promotor, senador e presidente do Estado, José Pereira dos Santos Andrade. Em lados opostos da praça estão a Universidade Federal do Paraná e o Teatro Guairá. Praça Osório: Em 1878, recebeu o nome de Largo Oceano Pacífico. É Praça General Osório desde 1879. Seu relógio, restaurado em 1993, marca a hora oficial da cidade. Tem fonte luminosa e equipamentos de lazer.

Na categoria “galeria” têm-se:

Galeria Júlio Moreira: Construída em 1976, liga a Rua José Bonifácio ao largo da Ordem. É o único subterrâneo oficial da cidade. Tem pontos comerciais e de animação cultural, como revistaria, lanchonete e o Teatro Universitário de Curitiba.

Galeria Lustoza: Galeria do centenário da emancipação política, construída em 1953. Sob o prédio Visconde de Taunay, de uso residencial e comercial, a galeria é passagem de pedestres entre o calçadão da Rua XV de Novembro e a Rua Marechal Deodoro da Fonseca.

Galeria Schaffer/Cine Groff: Prédio do início do século, recebeu esse nome em homenagem a família Schaffer, que em 1918, introduziu em Curitiba a venda do leite em garrafas de modelo alemão da Leiteria Schaffer. Em 1944, no térreo do edifício, instalou-se a Confeitaria Schaffer. Após dois incêndios, em 1929 e posteriormente em 1978, sua reconstrução se fez com recursos da campanha popular “Por Amor à Schaffer”, e em 1981 nasceu a Galeria Schaffer, como ponto de encontro cultural da cidade. Neste mesmo ano, a galeria inaugurou o Cine Groff, como cinema de arte, em homenagem a cinematografia paranaense de João Baptista Groff.

Galeria do Plano Agache: Marca do plano urbanístico de 1943, a galeria fica na Rua XV, entre Marechal Floriano Peixoto e Monsenhor Celso.

Os “marcos” para Boullón (2002, p. 197) são objetos, artefatos urbanos ou edifícios que, pela dimensão ou qualidade de sua forma, destacam-se do resto e atuam como pontos de referência exteriores ao observador/turista. Na proposta da “Linha Pinhão” foram identificados seis categorias destes elementos: edificações, igrejas, museus, mirantes, cartaz/painel e artefatos urbanos.

Na categoria “edificações” os destaques são:

Sociedade Beneficente Protetora dos Operários: Fundada em 1883, por Benedito Marques, com o objetivo de organizar e amparar os trabalhadores curitibanos. Ficou famosa com o popular “Ópera-Rio”, sediando carnavais e concursos gays.

Sociedade Garibaldi: Foi constituída em 1883, para proporcionar aos imigrantes italianos melhor integração na nova terra. Em 1993, foi transformada em Unidade de Interesse de Preservação Fundação Cultural de Curitiba: Construção de 1866/67, já foi residência, loja maçônica, escola, Quartel do Corpo de Polícia, sede do Quartel General e sede da Prefeitura e Câmara Municipal. No início dos anos 1970, o município comprou o casarão que restaurado, passou a sediar a Fundação Cultural de Curitiba, em 1975.

Unidades de Interesse de Preservação (UIP) - A concessão de incentivos fiscais possibilita a Preservação de Unidades Históricas. A Comissão de Avaliação do Patrimônio Cultural, criada em 1982, analisa as Unidades de Interesse de Preservação e concede reduções de IPTU para quem as mantiver em boas condições. Também pode conceder incentivo construtivo: a metragem que o terreno da UIP permite pode ser construída na área restante (http://www.celepar.br/curitiba/ ctba411.html)

Casa Romário Martins: “Uma casa portuguesa, com certeza”. Homenageia o cronista e historiador Alfredo Romário Martins, sendo o último exemplar da arquitetura luso-brasileira na cidade. Está localizada na esquina do Largo da Ordem com a Rua São Francisco, constituindo um dos marcos do Setor Histórico de Curitiba.

Casa Vermelha: Administrada pela Fundação Cultural de Curitiba, desde 1993, a Casa Vermelha, com este nome, começou em 1916. Na década de 1970, passou a ocupar seu atual endereço no Largo da Ordem, nº 143. Foi, durante décadas, casa tradicional no ramo de ferragens.

Grande Hotel Moderno: Inaugurado em 1913 pela família Caillet, localiza-se na Rua XV de Novembro, entre Barão do Rio Branco e Presidente Faria. Era endereço de reuniões dos barões de erva-mate e marco em Curitiba de um dos mais tradicionais hotéis do Brasil.

Café Alvorada: Ponto de café em pé, copiado de São Paulo, foi Palco de discussões e ponto de informações de jornalistas, estudantes e intelectuais, expandiu-se pela Rua XV de Novembro entre 1945 e 1955. Livrarias Chignone: Fundada em 1921 pelo imigrante italiano João Chignone. O prédio-sede fica na Rua XV, nº 423.

Confeitaria das Famílias: Localizada na Rua XV, desde 1945, criada pelo espanhol Jesús Alvarez Terzado. Seus doces tradicionais são os mesmos, desde sua fundação.

Banestado: Construção de 1883, do imigrante português Manoel da Costa Cunha, é, desde 1973, agência do Banco do Estado do Paraná.

Louvre: Construção de 1913, na Rua XV de Novembro. Abriga o fabuloso vitral francês da antiga loja “Louvre, o rei das sedas”.

Cine Ritz: Inaugurado, na versão atual, em 1985, por um acordo entre o município e a loja de departamentos C&A. Administrado pela Fundação Cultural de Curitiba, recria, no nome, o Cine Ritz que existiu na própria Rua XV, de 1947 a 1965.

Foto Brasil: Localizado na Rua XV de Novembro, foi inaugurado pelos irmãos Erich e Walter Jacobs em 1930. Em 1938, Isaac Kriger, apaixonado por fotografia, se tornou sócio do empreendimento onde, várias gerações de curitibanos marcaram seus momentos à frente dos cenários do estúdio Foto Brasil.

Bar Mignon: Famoso pelo “pernil com verde”, receita trazida da Calábria pela família Amatuzzi, é ponto de encontro tradicional dos curitibanos na Rua XV de Novembro, desde 1946.

Braz Hotel: Localizado na Avenida Luiz Xavier, desde 1935 e inaugurado primeiramente em 1930, na Praça Tiradentes, pelo casal português Maria e Francisco Braz. O hotel hospedou políticos e foi palco de muitos comícios na década de 1950, inclusive de Getúlio Vargas. Fechou em 1978 e reabriu, com o Grupo Slavieiro, em 1991.

Edifício Garcez: Em 1929, foi o primeiro arranha-céu de Curitiba. Abrigou
repartições públicas, associações, escolas e a entrada do Cine Palácio. Foi restaurado em 1985 e reaberto em 1988, como loja de departamentos. Hoje, abriga a Faculdade Internacional de Curitiba (Facinter).

Correio Velho: Nome popular da primeira agência oficial de correios e telégrafos de Curitiba, construída em 1934. Sua edificação foi considerada um marco da modernidade no Estado na década de 1930, com iluminação potente, elevadores, relógios eletrônicos e instalações telegráficas.

Universidade Federal do Paraná: Primeira Universidade fundada no Brasil, em 1912, e está na Praça Santos Andrade desde 1914. A Universidade do Paraná se tornou Universidade Federal em 1951 e, no ano seguinte, ganhou as escadarias que, desde 1993, abrigam a cada dezembro o presépio do Natal de Luz de Curitiba.

(Natal Luz de Curitiba - O cenário principal para a maior parte dos acontecimentos natalinos de Curitiba é a histórica Rua XV de Novembro, que durante a época de Natal se transforma na Rua de Cristal, com seus postes republicanos totalmente iluminados. É na Rua de Cristal que acontecem os principais eventos natalinos. A atração mais esperada é sem dúvida nenhuma o Natal do HSBC, que desde 1991 se tornou um dos cartões postais natalinos da cidade. Todos os anos o banco enfeita completamente sua sede, o histórico prédio Palácio Avenida. São mais de 100 mil minilâmpadas para a decoração. (http://www.brasilviagem.com/materia/?CodMateria=14&CodPagina =49).

Bar Triângulo: O lugar da antiga boemia curitibana, inaugurado em 1934, recebeu o nome popular de cachorro-quente, devido ao seu peculiar luminoso na fachada do bar. O prédio passou por uma reforma em 1974.

Palácio Avenida: Desta edificação de 1929, resta a imponente fachada na esquina da Avenida Luiz Xavier com a Travessa Oliveira Bello. Já abrigou um café, o folclórico bar Guairacá e o Cine Avenida, um dos primeiros cinemas de Curitiba. Marco da paisagem urbana, foi recuperado e reaberto em 1991 pelo Grupo Bamerindus, atualmente HSBC. Desde esta data, acontecem apresentações natalinas do Coral dos Infantes Cantores e da Terceira Idade, em um espetáculo de luzes e cores.

Na categoria “igrejas” têm-se:

Arcadas de São Francisco: Em 1811 ficaram prontas a capela-mor e a sacristia, ficando inacabada e em ruínas a Igreja de São Francisco de Paula. Em 1860, as pedras que finalizariam a obra teriam sido usadas na conclusão da torre da antiga Matriz. Em 1995 o espaço foi revitalizado, com comércio típico sob as arcadas e espetáculos no palco, com arquibancadas ao ar livre.

Igreja do Rosário: Terceira igreja de Curitiba, construída no século XVIII. Era a igreja dos escravos – Igreja do Rosário dos Pretos de São Benedito. A
construção original foi demolida em 1931 e a atual data de 1946.

Igreja Presbiteriana Independente: Construção de 1934, originária da divisão
da Igreja Presbiteriana Tradicional, ocorrida no Brasil em 1903.

Igreja da Ordem: É o principal ponto de referência do Largo da Ordem, no Setor Histórico de Curitiba. Construída em 1737 e, por duas vezes, restaurada. Mantendo suas características originais, a Igreja da Ordem é a mais antiga edificação católica em pé da capital.

Catedral Basílica Menor de Nossa Senhora da Luz: Construção neo-gótica de 1893. É assim chamada desde 8 de setembro de 1993, dia da Padroeira.

Na categoria “museus” têm-se:

Museu de Arte Sacra: Anexo a Igreja da Ordem, este museu existe desde 1981. Seu acervo, originado da Arquidiocese de Curitiba, sintetiza as quatro igrejas do Setor Histórico: a Catedral, a da Ordem, do Rosário e as Ruínas de São Francisco.

Museu na Rua: As antigas edificações da Travessa Nestor de Castro servem de suporte para o conjunto de painéis do artista curitibano Poty Lazzarotto, dentre outras exposições que constituem o Museu na Rua.

Museu de Arte do Paraná: Construção de 1916, abrigou a Prefeitura Municipal
de Curitiba. Em 1973, tornou-se Museu Paranaense recontando, com seu acervo, a história do Estado. O prédio é tombado pelo patrimônio histórico e artístico do Estado e da União. Recentemente o prédio foi restaurado e hoje abriga o Museu de Arte do Paraná.

Na categoria “mirante” tem-se:

Belvedere: Mirante construído em 1915, que em 1922 abrigou a primeira emissora de rádio do Paraná, a PRB-2. Em 1931, foi observatório astronômico e meteorológico. Desde 1962 abriga a União Cívica Feminina.

Na categoria “artefatos urbanos” têm-se:

Relógio das Flores: Localizado na Praça Garibaldi desde 1972, o relógio composto de flores coloridas tem 8 metros de diâmetro e funciona à base de emissão vibrátil de quartzo. É acionado com impulsos eletrônicos de um relógio-comando instalado na Igreja do Rosário.

Bondinho: Velho bonde reciclado e pintado em cores vivas, estacionado na Rua XV de Novembro, acolhe mães nas redondezas, desde 1973. Em seu interior, as crianças exercem atividades de lazer orientadas por técnicos da Fundação Cultural de Curitiba.

Os “setores” são partes das cidades substancialmente menores que os bairros, porém, com forte característica histórica.

Na “Linha Pinhão” encontra-se apenas um setor:

Largo da Ordem: Possui algumas edificações originais que permanecem arquitetonicamente conservadas dentro de um novo caráter comercial alcançado pelo centro. Seu nome oficial é Largo Coronel Enéas de Paula, desde 1917. É considerado, por suas características histórico-culturais, como uma das partes turisticamente mais promovidas da cidade.

Segundo Boullón (2002, p. 209), os “roteiros” constituem as vias de circulação para o trânsito turístico de veículos e de pedestres. Um roteiro deve atender as
expectativas dos turistas e oferecer a melhor maneira de percorrê-lo. Nem sempre o melhor caminho é o mais curto, o importante é verificar a qualidade do espaço a ser percorrido.

A “Linha Pinhão” é um roteiro, entretanto, oferece seis sub-roteiros opcionais, como apresentados a seguir:

Roteiro 1 – Ao optar pelo Roteiro 1, que abrande o Largo Coronel Enéas (Largo da Ordem), no encontro das ruas Mateus Leme e São Francisco, merecem atenção, na rua Mateus Leme: a Casa do Artesanato que, comercializa o artesanato local; a Casa João Turin, espaço destinado à exposições do artista ítalo-curitibano que lhe empresta o nome; o Centro Juvenil de Artes Plásticas; e o Conservatório de Música Popular Brasileira, referência nacional em MPB, com biblioteca, loja de discos e oficina de restauração de instrumentos. Na rua São Francisco, destacam-se: antigos casarões de imigrantes alemães; o Museu Guido Viaro, da década de cinqüenta e que pertencia à Força Aérea Brasileira, onde funciona também, o
Ateliê Livre de Belas Artes.

Roteiro 2 – Confluência das ruas José Bonifácio e Saldanha Marinho. Seguindo pela rua Saldanha Marinho até a rua Doutor Muricy, está a Sala Miguel Bakun, integrada ao prédio-sede da Secretaria do Estado da Cultura do Paraná (antigo Gymnasio Paranaense), com espaço para exposições e que homenageia um dos grandes pintores paranaenses de tradição ucraniana. Na esquina da rua Cruz Machado, está o Memorial Brasileiro de Design, referência local e nacional. Neste roteiro, destaca-se ainda a Casa Vermelha construída em 1891, foi encomendada pelo alemão Wilhelm Peters. Abrigou a firma Burmester, Thon e Companhia até 1912. Foi depósito e sede da União Comercial, com 20 integrantes, dissolvida em 1924. A Casa Vermelha, com este nome, começou em 1916, na Rua José Bonifácio, nº 15, de propriedade de Eurico Fonseca dos Santos e sócios. Na década de 70, a Casa Vermelha passou a ocupar o atual endereço, no nº 143 do Largo da Ordem. Foi, durante décadas, casa tradicional no ramo das ferragens. Desde 1993, é espaço administrado pela Fundação Cultural de Curitiba.

Roteiro 3 – Seguindo pela rua Barão do Rio Branco, no encontro com a rua XV de Novembro, em direção ao sul, chega-se a Praça Eufrásio Correia, no decorrer desse trecho destacam-se: a velha sede do Clube Curitibano (hoje estabelecimento comercial); a antiga Estação Ferroviária, construção de 1885; o Centro de Convenções, antigo Cine-teatro Vitória; o Hotel Johnscher, do final do século XIX; o Museu da Imagem e do Som do Paraná, construção de 1890 que abrigou a primeira sede do Governo do Estado do Paraná; e o conjunto arquitetônico da Praça Eufrásio Correia, tombado como patrimônio histórico e artístico estadual, com casarões de vários usos. Os antigos hotéis Tassi e Roma da primeira metade do século XX.

Roteiro 4 – Na esquina da rua Barão do Rio Branco e XV de Novembro sentido Norte, inicia a histórica Rua Riachuelo, que em 1995 voltou a ser aberta ao tráfego de automóveis e alguns de seus casarões históricos foram recuperados pelo projeto Cores da Cidade. A rua revela um comércio característico, com destacadas edificações.

Roteiro 5 – Esquina das ruas XV de Novembro e Doutor Muricy. Subindo pela rua Doutor Muricy, chega-se a Biblioteca Pública do Paraná, onde, até 1953, funcionou o antigo Theatro São Theodoro, depois Teatro Guairá. Contém o maior acervo regional de publicações e que foi inaugurada em comemoração ao centenário da emancipação política do Paraná.

Roteiro 6 – Rua XV de Novembro, esquina com Travessa Oliveira Bello, que seguindo-a alcança-se a Praça Zacarias, a Rua Emiliano Perneta e, na esquina desta com a Rua Desembargador Westplalen, o Museu de Arte Contemporânea do Paraná. O Museu abriga, em acervo, as manifestações artísticas contemporâneas.

A classificação e caracterização dos elementos reforçam a importância de se pensar o planejamento turístico urbano a partir das concepções apontadas por Lynch e Boullón.

Considerando o turismo como consumidor do espaço, o planejamento é imprescindível, porque o espaço é elemento básico do desenvolvimento turístico, pois abriga os recursos ambientais e culturais dos destinos turísticos, além de ser o espaço físico destinado à instalação da infra-estrutura e dos equipamentos turísticos. O uso do espaço pelo turismo e a fragilidade dos recursos, tanto naturais como culturais, dos quais dependem o turismo para sua continuidade, justificam a necessidade de recorrer à técnica de planejamento como forma de garantir um desenvolvimento turístico adequado. Contudo, o planejamento da atividade turística deve estar articulado com as políticas e ações que orientam o desenvolvimento urbano da cidade.

Dessa forma não se pode entender o turismo como um fenômeno isolado, que cresce espontaneamente, não necessitando de interferências, parâmetros e diretrizes para ser implantado nas localidades turísticas ou potencialmente turísticas.

Assim como já existe, em grande parte dos municípios, a preocupação com o planejamento urbano no sentido de estabelecer metas, parâmetros e diretrizes de uso e ocupação do espaço urbano – Curitiba, através da análise histórica de suas políticas de desenvolvimento urbano demonstra essa preocupação.

Magalhães (2002) ressalta que a falta de planejamento pode levar à destruição dos potenciais natural e cultural de um lugar em curto espaço de tempo. Isso significa destruir a matéria-prima do turismo. Nesse sentido, o zoneamento de uso e ocupação do solo analisado em Curitiba demonstra ações que garantem o uso de alguns elementos da área central para fins turísticos. Dentre essas ações de planejamento urbano, é válido ressaltar a transformação da Rua XV – principal logradouro da cidade – em calçadão; a delimitação do Setor Histórico que estimulou a preservação do patrimônio histórico, cultural e arquitetônico da área central, potencializado pela Lei do Solo Criado, que, como mencionado anteriormente, garantiu a restauração de algumas edificações históricas, consideradas marcos urbanos da paisagem do centro da cidade. Nesse contexto, inúmeros marcos da paisagem urbana como aqueles identificados e interpretados na Linha Pinhão, mantiveram-se preservados e se destacam para uso turístico no Centro de Curitiba. Essa reflexão permite considerar que tanto o planejamento urbano integrado, como o planejamento setorial do turismo devem ser implementados de forma articulada, levando-se em conta que mesmo os espaços já apropriados pelo turismo, ou aqueles com vocação à sua exploração, dependem de uma ação conjunta dos órgãos públicos, da iniciativa privada e da plena participação da comunidade local para um promissor desenvolvimento.

O Plano Diretor, assim como os planos, programas e projetos turísticos, deve orientar os investimentos estruturais, definindo o papel de cada agente de desenvolvimento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este estudo teve como questão central à análise dos elementos do espaço turístico urbano e suas relações com o processo de planejamento. Seu objeto de investigação concentrou-se na área central de Curitiba-PR em virtude de seu valor simbólico e histórico na preservação da identidade local, e também pelo bairro ter vivenciado todas as fases da história da cidade e de seu planejamento. A área central de Curitiba é apresentada como “escala bairro”, com “bordas/limites”, e também descrita através de seus elementos: “setores”, “vias”, “pontos nodais” e “marcos”.

Reflexões teóricas fundamentaram a investigação sobre turismo, planejamento e sobre conceitos de espaço urbano e espaço turístico urbano. Buscou-se diferenciar e articular esses conceitos, além de apontar os elementos constituintes do espaço turístico urbano. Essa análise apoiou-se, sobretudo, em Kevin Lynch, José Lamas e Roberto Boullón, numa contraposição destes diferentes autores.

Como uma análise do universo dos “logradouros”, “marcos”, “setores” e “roteiros” da área central de Curitiba, objeto de estudo, seria por demais exaustiva, limitou-se apenas a dos bens tombados, ou seja, aqueles que estão sob proteção. Ordenou-se os elementos do espaço urbano tombados com base nos estudos de Lynch e Boullón.

Entre os bens tombados da área central, destaque foi a identificação de dois “setores”: o primeiro ao redor do Lago da Ordem, o segundo nas imediações da Antiga Estação Ferroviária. Também um “roteiro” encontra-se, entre os bens tombados, o trecho que abrange as praças Ozório e Santos Andrade, ligadas por uma via com duas denominações, ou seja, a Rua XV de Novembro e a Avenida Luis Xavier. Os “marcos” que não compõem estes setores e roteiro restringiram-se basicamente a edificações.

Um “logradouro” isolado também foi identificado, trata-se do Passeio Público.

A predominância de elementos do espaço urbano que passaram por mudanças de uso e que hoje desempenham atividades culturais acentua a relevância histórica representada quantitativa e qualitativamente pelos bens tombados no centro de Curitiba. A presença de praças e jardim, entre os bens tombados, denota também a preocupação com a conservação de áreas verdes urbanas.

Para a análise do planejamento do espaço turístico urbano, partiu-se do princípio de que planejamento pressupõe não apenas se pensar cada elemento deste espaço isoladamente, como também a articulação destes entre si e com o contexto onde estão inseridos. Buscou-se, todavia, identificar como os diferentes elementos deste espaço são trabalhados no planejamento turístico e no planejamento urbano. As reflexões giraram também em torno das inter-relações entre estes dois tipos de planejamento, o planejamento setorial e o planejamento integrado.

Para o planejamento do turismo o referencial de análise foi o Projeto “Linha Pinhão – Pegadas da Memória”. Este roteiro cultural e histórico para conhecer o centro de Curitiba a pé, inaugurado em 1993 dentro das festividades do tricentenário da fundação de Curitiba, teve seu planejamento alicerçado nos elementos do espaço turístico urbano. Desta forma, pode-se ordenar seus elementos de acordo com as classificações de Lynch e Boullón. Ruas, cruzamentos, praças e galerias do roteiro foram classificadas como “logradouros”. Edificações, entre elas igrejas e museus, foram considerados “marcos”. O setor histórico enquadrou-se na categoria “setor” e os seis roteiros propostos enquadraram-se na categoria “roteiro”.

A partir da análise de planos e projetos verificados na área central de Curitiba, identificou-se elementos deste espaço que são trabalhados no planejamento turístico e no planejamento urbano. A análise da inter-relação entre estes dois tipos de planejamento, implica considerar que o planejamento urbano previsto para a área central é muito mais concreto e aplicável, se comparado ao planejamento turístico.

O estudo da Linha Pinhão, como objeto de análise, confirma essa dicotomia ente essas duas formas de planejamento. A Linha Pinhão é uma proposta coerente e totalmente possível para se implementar no centro da cidade como roteiro turístico, contudo, sua aplicabilidade não saiu, de fato, do papel. Falta aí, uma maior integração entre aquilo que se propõe para o turismo e aquilo que o espaço urbano, por si só, oferece enquanto suporte e atrativo para o turismo. Uma ação mais efetiva deste projeto pode viabilizá-lo e transformá-lo em mais um produto turístico para a cidade como um todo. Para tanto algumas diretrizes precisam ser adotadas, e, pensando nessa possível inter-relação entre planejar o urbano e planejar o turismo, propõe-se:
1. Rever os bens históricos que compõem a Linha Pinhão, verificando as possíveis mudanças de uso e/ou ações de tombamento;
2. Reeditar o guia proposto para Linha Pinhão (FENIANOS; MENDONÇA, 1996), com as devidas atualizações;
3. Envolver o poder público e a iniciativa privada, na tentativa de inserir este roteiro, primeiramente na comunidade, e posteriormente na região e até no país;
4. Desenvolver um trabalho de monitoramento, através de visitas orientadas, envolvendo dessa forma, acadêmicos dos cursos superiores de turismo, história, geografia e outras áreas afins;
5. Desenvolver cursos de capacitação de monitores para esse roteiro.
Essas são algumas estratégias que podem subsidiar o pleno desenvolvimento da Linha Pinhão, aproveitando a história que o centro da cidade é capaz de contar, seja através de pessoas ou do patrimônio histórico que perpassa de geração pra geração.

Já a análise do planejamento integrado, através do Plano Diretor Municipal, mais especificamente o zoneamento do uso e ocupação do solo dele derivado (Lei 9800/2000 e decretos complementares), apresentou-se mais complexa. Diferentemente do planejamento setorial do turismo, o planejamento urbano tem uma concepção integrada, trabalhando os elementos do espaço de forma articulada e no contexto onde se inserem.

O Decreto 1.160/1971 que cria e delimita o Setor Histórico de Curitiba, na área central, ressalta o uso do elemento “setor” de Boullón (2002) pelo Planejamento Urbano. O estabelecimento de área exclusiva para pedestres na Rua XV de Novembro, também na década de 1970, demonstra a transformação desta rua, “logradouro” segundo a classificação de Lynch, em Calçadão, atribui-lhe uma função de “roteiro”, como classifica Boullón.

A Lei 6.337 de 1982, conhecida como Lei do Solo Criado, propõe a criação de um instrumento destinado à preservação do patrimônio histórico, cultural e arquitetônico da cidade. Esta Lei foi usada para restauração de três edificações históricas, consideradas “marcos” no centro da cidade segundo a classificação de Lynch e Boullón: a Universidade Federal do Paraná, a Catedral Metropolitana de Curitiba e a Sociedade Garibaldi.

Para se ampliar os espaços de passeio para pedestres foi instituído, através do Decreto 184 de 2000, incentivos para galerias comerciais em edifícios de habitação coletiva. Esta medida vem evidenciando o elemento “logradouro” da classificação de Lynch.

O zoneamento do uso e ocupação do solo urbano, Lei 9800 de 2000, é um mecanismo de planejamento urbano que disciplina o espaço para que à estrutura urbana concedida pelas diretrizes do Plano Diretor se viabilize. O estabelecimento de zonas, com funções e parâmetros específicos, transforma o centro da cidade em um mosaico de “setores”, como os da classificação de Boullón.

Assim, face à dinâmica urbana, não se pode falar em planejamento turístico desconsiderando a organização espacial das cidades e as políticas urbanas que ordenam o seu crescimento, uma vez que, a organização do turismo é inseparável da própria construção do espaço urbano. Portanto, é necessário estabelecer ligações do turismo com a organização do espaço onde este se insere.

Neste sentido, pode-se dizer que o grande equívoco por parte dos planejadores e de muitos profissionais do turismo é a visão fragmentada da atividade em meio à contradição entre ofertas bem sucedidas (hotéis, atrativos, etc.) e o contexto socioeconômico. Observa-se o descaso ou a deterioração das construções urbanas, a falta da valorização cultural nas cidades, que devem ser pensadas no processo de desenvolvimento do turismo, e que vai muito além das simples facilidades de acesso a atrativos ou estruturadas cadeias hoteleiras, consideradas até então como premissas básicas do turismo.

REFERÊNCIAS
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