Rennes le Château é uma pequena aldeia situada no sul da França, onde supostamente teria vivido em segredo uma descendência de Cristo por via da Dinastia Merovíngia. Lá se encontra a famosa igreja na qual Bérenger Saunière teria descoberto uns misteriosos pergaminhos que constituiriam prova deste segredo, o qual teria dado a Saunière enorme prestígio e riqueza, coisa improvável para um padre da região.
Torre Magdala
Os merovíngios foram uma dinastia franca saliana que governou os francos numa região correspondente, grosso modo, à antiga Gália da metade do século V à metade do século VIII. Seus governantes se envolveram com freqüência em guerras civis entre os ramos da família. No último século de domínio merovíngio, a dinastia foi progressivamente empurrada para uma função meramente cerimonial. O domínio merovíngio foi encerrado por um golpe de Estado em 751 quando Pepino o Breve formalmente depôs Childerico III, dando início à dinastia Carolíngia.
Francois-Bérenger Saunière (11abr1852 a 22jan1917) foi pároco da aldeia de Rennes-le-Château, no sul de França. Saunière efetuou, ao longo da sua estadia na aldeia, uma série de obras que envolveram o restauro da igreja dedicada a Santa Maria Madalena, a recuperação do presbitério, a construção de uma moradia à qual chamou Villa Béthanie, e a construção de uma torre para servir de biblioteca à qual chamou Torre Magdala. Desde cedo, surgiram rumores acerca de qual seria a origem dos fundos usados por Saunière para todos estes empreendimentos, normalmente fora do alcance da bolsa de um padre de aldeia. Saunière tinha conseguido lançar uma campanha de angariação de fundos junto de jornais e pequenas publicações católicas, com vista a financiar o seu projeto de tornar Rennes-le-Château num santuário dedicado a Santa Maria Madalena. Em grande medida, os fundos consistiam em dinheiro que os fiéis enviavam ao padre Saunière para ele rezar missas em Rennes-le-Château, mas também incluíam donativos de particulares. Saunière, por obrigação canônica, nunca poderia ficar com os excedentes que ultrapassassem as três intenções de missa por dia. Ao fim de pouco tempo, Saunière perdeu o controle das entradas de dinheiro, porque a sua campanha de angariação correu muito melhor do que ele imaginara. Em vez de devolver os excedentes (as missas que não pudesse rezar) ao seu superior o bispo de Carcassonne, Saunière decidiu usar o dinheiro para as suas obras, que para mais foram registradas legalmente em nome da sua governanta, Marie Dénarnaud.
Um processo eclesiástico conduzido entre 1910 e 1911 pelo bispo de Carcassonne, Monsenhor de Beauséjour, concluiu que o padre Saunière tinha obtido o dinheiro por meios ilegais, através da prática da simonia, por via do tráfico de intenções de missa e do desvio de fundos que canonicamente deveriam ter sido administrados pela diocese. Na sequência do processo eclesiástico, o nome de Saunière ficou manchado na opinião pública. O padre Saunière sentiu as dificuldades a surgirem, visto que as intenções de missa diminuíram em volume e em regularidade. Saunière morreria na miséria a 22jan1917, com graves dívidas financeiras aos seus fornecedores e com as suas propriedades hipotecadas. A sua governanta Marie Dénarnaud herdaria esta situação financeira débil, e teria que viver na miséria até à sua morte em 1953. Provavelmente desejosa de recuperar a imagem pública do seu antigo patrão, Marie Dénarnaud cedo lançou o boato de que o padre Saunière tinha construido tudo graças à descoberta de um tesouro enterrado sob a aldeia.
A 22jul1946, Dénarnaud cede as antigas propriedades de Saunière à família Corbu. Noel Corbu decidira fazer da Villa Béthanie um hotel com restaurante, ao qual chamou Hôtel de la Tour. Desejoso de atrair turistas, Corbu gravou em fita magnética uma versão fantasiosa da vida de Saunière, na qual ele dava largas à sua imaginação, inserindo detalhes retirados da lenda criada por Marie Dénarnaud. Esta fita magnética era reproduzida na sala de jantar do seu restaurante, de forma a entreter os turistas durante as refeições. A versão romanesca da vida de Saunière escrita por Corbu gozou de grande popularidade naquele tempo.
É no final dos anos cinquenta que a imprensa regional acorda para este assunto. Jornais como o La Dépèche du Midi escrevem longos artigos sobre o "padre dos milhões" de Rennes-le-Château. Nascera a febre da caça ao tesouro, que iria assolar a aldeia durante os anos sessenta, com a chegada dos caçadores de tesouros que procuravam descobrir a lendária fortuna de Saunière. Entre os exploradores que efetuaram trabalhos em Rennes-le-Château durante os anos sessenta, pode ser destacado o nome de Robert Charroux, pseudónimo de Robert-Joseph Grugeau (1909-1978). É no final dos anos sessenta que Pierre Plantard e Phillipe de Chérisey, os criadores do Priorado de Sião, descobrem o mistério de Rennes-le-Château graças ao jornalista e escritor de temas esotéricos Gérard de Sède. O Priorado de Sião iria usar amplamente o património lendário desta aldeia, e a vida polémica do padre Saunière, para sugerir que teria sido a descoberta por Saunière de uns misteriosos pergaminhos codificados durante as obras de restauro da igreja de Santa Maria Madalena que teriam permitido o enriquecimento do padre, que com eles teria feito chantagem junto do Vaticano.
Na verdade, os pergaminhos codificados eram uma criação de Phillipe de Chérisey, conforme atestado por correspondência pessoal. Uma carta enviada pelo advogado de Chérisey, o Dr. Boccon-Gibod, datada de 8out1967, dá conta de uma desavença editorial entre Chérisey e Gérard de Sède. Nesta carta, o advogado afirma claramente que os pergaminhos são da autoria de Phillipe de Chérisey. Os pergaminhos são composições em código elaboradas por Phillipe de Chérisey a partir de textos neotestamentários, conforme demonstrou o investigador Wielland Willker, ao identificar que um dos pergaminhos composto por Chérisey estava baseado no Codex Bezae. Estes pergaminhos codificados serviriam ao Priorado de Sião como forma de tentar provar a sobrevivência de uma dinastia merovíngia oculta em Rennes-le-Château. Pierre Plantard proclamava-se herdeiro da coroa de França, porque tencionava provar que descendia do rei merovíngio Dagoberto II. Os famosos "Dossiês Secretos", atribuídos falsamente a um Henri Lobineau, e depositados em 1967 na Biblioteca Nacional de Paris, são um conjunto de panfletos compostos por genealogias inventadas e documentos falsos, tudo com vista à elaboração da fraude da ascendência merovíngia de Pierre Plantard.
O assunto foi divulgado à escala global graças à obra de Henry Lincoln, Michael Baigent e Richard Leigh, co-autores da obra O Sangue de Cristo e o Santo Graal editada pela primeira vez em Londres no ano de 1982 (no Brasil, editada com o título O Santo Graal e a Linhagem Sagrada). Nesta obra, os autores iriam utilizar o material ficcional do Priorado de Sião para o expandir, sugerindo que a dinastia merovíngia descenderia de Jesus Cristo. Recentemente, o autor norte-americano Dan Brown, com o seu romance The Da Vinci Code, relançou esta fraude junto da opinião pública. A versão adulterada pelo Priorado de Sião da vida do padre Bérenger Saunière é aquela que goza de maior popularidade junto do público leitor destas obras, mas a verdade acerca da vida deste polémico sacerdote é bem diferente, e pode ser conhecida com grande detalhe graças a ampla documentação por ele deixada e graças aos arquivos municipais de Carcassonne.
Eles eram citados às vezes por seus contemporâneos como os "reis de cabelos longos" (em latim reges criniti), por não cortarem simbolicamente os cabelos (tradicionalmente, os líderes tribais dos francos exibiam seus longos cabelos como distinção dos cabelos curtos dos romanos e do clero). O termo "merovíngio" deriva do latim medieval Merovingi ou Merohingi "filhos de Meroveu", alteração de uma forma não atestada do baixo franconiano ocidental antigo, relacionada ao nome da dinastia em inglês antigo, Merewīowing, com o final -ing sendo um sufixo típico patronímico.
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